A jararaca está viva

 © Mauricio Lima|AFP|Veja

… Como ele mesmo disse, “a jararaca está viva”.

Não só viva, como tonificada por um governo que anuncia uma reforma da Previdência que mais se parece a um rebanho de bodes. Se isso fosse pouco, falta-lhe a humildade de reconhecer que a prometida (e indefinida) reforma trabalhista foi um balão de ensaio para enternecer o andar de cima, que acabou enfurecendo o de baixo.

A jararaca poderá morrer com uma sentença judicial, mas o acordão do Supremo Tribunal que manteve Renan Calheiros na presidência do Senado foi um presente para o comissariado. Só o tempo e os autos dirão se as culpas de Lula são suficientes para torná-lo inelegível. Para quem se esgoelou na avenida Paulista gritando “Lula cachaceiro, devolve o meu dinheiro” as notícias são ruins.

Temer despencou e Lula cresceu em Datafolha; a jararaca está viva

Os números da pesquisa Datafolha foram claros. Em julho, 31% dos entrevistados achavam que o governo de Michel Temer era ruim ou péssimo. No início de dezembro, antes que se conhecesse o conteúdo da primeira colaboração da Odebrecht, eram 51%. Tudo bem, ele recebeu uma herança maldita, mas enquanto o PT paga sua conta com a Lava Jato há mais de um ano, o PMDB de Renan Calheiros, Romero Jucá, Moreira Franco e Eliseu Padilha só agora começou a receber a visita dos cobradores. Quem sabe um dia a economia começa a respirar, a Lava Jato sai da ribalta e são Jorge ajuda. Prometendo uma “Ponte para o Futuro”, Temer oferecia esperança, pedindo confiança. A ponte virou pinguela e, como diz Fernando Henrique Cardoso, é a que temos.

A mesma pesquisa informou que entre março e dezembro Lula pulou de 17% para 25%, nas preferências para um primeiro turno na próxima eleição presidencial, com variações desprezíveis dependendo do cenário. Atrás dele vem Marina Silva em cerca de 15%, em queda em todos os cenários. Numa previsão de segundo turno, Marina derrota Lula e todos os outros. Nessas simulações, “Nosso Guia” (expressão cunhada pelo então chanceler Celso Amorim) derrota todos os outros, salvo Marina. A cruz de Lula é sua rejeição (44%), empatado com Temer (45%).

Pesquisa de opinião em 2016 para uma eleição que está marcada para 2018 vale pouco mais que um horóscopo, mas o sinal que vem do Datafolha é claro: o caminho de “todos os outros” será pedregoso. Marina Silva prevalece num segundo turno, contra Lula, Geraldo Alckmin, Aécio Neves e José Serra. Lula só perde para ela. Como ele mesmo disse, “a jararaca está viva”.

Não só viva, como tonificada por um governo que anuncia uma reforma da Previdência que mais se parece a um rebanho de bodes. Se isso fosse pouco, falta-lhe a humildade de reconhecer que a prometida (e indefinida) reforma trabalhista foi um balão de ensaio para enternecer o andar de cima, que acabou enfurecendo o de baixo.

A jararaca poderá morrer com uma sentença judicial, mas o acordão do Supremo Tribunal que manteve Renan Calheiros na presidência do Senado foi um presente para o comissariado. Só o tempo e os autos dirão se as culpas de Lula são suficientes para torná-lo inelegível. Para quem se esgoelou na avenida Paulista gritando “Lula cachaceiro, devolve o meu dinheiro” as notícias são ruins.

Os brasileiros olham com desdém para a política argentina e desprezam os vizinhos encantados pelo fenômeno do peronismo. Afinal Juan Perón foi um general larápio deposto em 1955 que voltou ao poder, caquético, em 1973 e morreu em 1974 deixando o governo para sua mulher Isabelita, uma senhora que conheceu num cabaré panamenho.

O peronismo sobreviveu a dois golpes e na sua última encarnação chamou-se kirchnerisno. Quando Perón foi deposto em 1955, os militares fizeram uma exposição das joias e vestidos de sua mulher Evita, morta pouco antes. Coisa para classificar o luxo do casal Sérgio Cabral como “periferia chic”. Vestidos? Christian Dior e Balenciaga. Joias? Uma tiara de brilhantes.

São muitas as teorias para explicar a resistência do peronismo. Seu oxigênio é a demofobia do andar de cima argentino. É uma gente finíssima, deu a duquesa de York à Inglaterra e a rainha Máxima à Holanda, só não entende um povo que vê em Evita uma princesa.

Clovis Rossi – Folha de São Paulo

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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