A Louca

Lembra daquela mulher que costumava passear pelas estrelas, bastando deitar-se e fechar os olhos? Sou eu. Estou de volta de uma daquelas viagens. Foi a mais demorada de todas. A Via Láctea tinha tantos planetas, tantos sóis, que meus olhos se ofuscaram e eu não soube encontrar a estação de volta. Visitei o buraco negro. E de repente estava diante de ti. Teu sexo sem nexo, diante do qual, genuflexa, entrava em vertigem. Vi anjos – não apenas um ou dois: um séqüito. Fiquei perplexa.

Pois alvíssimas vestes vestiam, plúmbeos, desconexos; de uma brancura imensa, algodã. E quando me recordo do supremo sacrilégio – indagar-me por que não funcionava o relógio –, me surgiram, de abrupto, o cheiro da romã, um eixo convexo, um campo polimagnético.

Abriram-me o córtex. Mergulhei em mim. Era, sem cores, o vazio. E quando procurei em ti a culpa para meus mortos, meus caminhos tortos, um arrepio: tomou-me um eflúvio, uma exalação.Uma força avassaladora, um jardim com todas as flores, todos os sabores, todas as dores, odores, – você – destruíra minha razão.

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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