A vida imita a arte

Oscar Wilde disse que a vida imita a arte muito mais do que a arte imita a vida. No dia 21 de fevereiro de 1986 a Globo exibia às 20h00 o último capítulo da novela Roque Santeiro, a novela de maior sucesso da história da emissora.

Na pequena cidade de Asa Branca, Roque Santeiro foi um antigo morador, que fazia milagres e morreu como mártir, defendendo a cidade de um bandido: – tudo mentira. Porcina se dizia a viúva do mártir, outra balela.

Sinhozinho Malta (Lima Duarte) era um poderoso fazendeiro e chefe político local, apaixonou-se pela alegre viúva Porcina (Regina Duarte). Roque Santeiro (José Wilker) era tido como morto, mas estava vivo e retornou à cidade.

A novela transcorre na dúvida com qual dos dois personagens a viúva ficaria. Havia três finais possíveis para a novela: no primeiro Porcina ficaria com Sinhozinho Malta; no segundo, com Roque Santeiro e, no terceiro, a viúva ficaria com Rodésio (Tony Tornado), seu motorista, este último nunca foi divulgado pela emissora.

A novela da vida real começou com o convite para a atriz Regina Duarte assumir a Secretaria Especial de Cultura, em 17 de janeiro, e se enrolou, como novela, até 4 de março de 2020, com uma posse teatral, cercada de pompa e circunstância.

Neste meio tempo, certa ala do governo, descobriu fotos nos arquivos do Serviço Nacional de Informação (SNI) de Regina com Fidel Castro, em junho de 1984, ela era vigiada pelo então serviço secreto do governo, que mais tarde passaria a se chamar ABIN. Imaginem só, os militares da época não admitiam na novela as palavras de baixo calão e censuraram a palavra “bosta”, para hoje, participarem de reuniões ministeriais, nas quais, os palavrões são como vírgulas em cada frase proferida.

A novela Roque Santeiro, teve uma primeira versão que foi censurada pela Ditadura em 1975, Betty Faria seria a Viúva Porcina, Francisco Cuoco, Roque e Lima Duarte seria Sinhozinho Malta, somente ele manteve o personagem na novela seguinte.

No final, a viúva Porcina fica com o poderoso local, Sinhozinho Malta. Na vida real o papel da atriz na Secretaria de Cultura terminou no dia 10 de maio de 2020. Para ela foi prometida a Cinemateca de São Paulo, porém nunca a assumiu pois o cargo prometido, sequer existe.

Na novela Roque Santeiro Porcina não era a suposta viúva de Roque Santeiro, mas nem o conhecia, e o mito do herói salvador era outra farsa, cultivada pela elite da cidade. Assim a realidade imita a arte.

Regina Duarte sequer conhecia o atual presidente, ele também é uma criação mítica das redes sociais, fake news, e da televisão, aliás, como alguns de seus ex-ministros e todos aqueles que se aproveitaram da onda eleitoral, pseudomoralista, para abocanharem seus mandatos no legislativo e no executivo.

Todos os dias temos um capítulo desta novela do gênero tragédia, cujo enredo tem um Sinhozinho, que monta cavalo, destrata a imprensa, maquia dados da pandemia, considera as mortes como mera estatística e, essencialmente, descumpre as leis e a Constituição.

A diferença é que a novela da vida real, não é ficção.

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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