Acabou o inverno?

Segundo o calendário aí atrás da porta, o inverno termina oficialmente no dia 23 de setembro. Menos em Curitiba. Neste primeiro planalto, calendário tem serventia para lembrar o santo e as efemérides do dia.

Os sinos precocemente bimbalham, ainda não é dezembro, mas bastariam três dias de sol, céu de brigadeiro e o retorno do sobretudo ao cabide, para o curitibano perguntar:

— Acabou o inverno?

Verdade verdadeira, é que o fim do inverno curitibano só é sacramentado no dia em que os ipês da Catedral Metropolitana florescem, quando as praças de Curitiba amanhecem amarelas em flor. Aí, sim! – acabou o inverno, seja julho, agosto ou começo de setembro. E revogam-se previsões climáticas em contrário.

Mas há quem duvide. Os neocuritibanos, por exemplo. Para essas aves de arribação, temos outros sintomas – além da flor do ipê -que atestam o fim precoce do inverno curitibano.

O teste do vampiro.
Se algum contemplado cruzar com Dalton Trevisan, nas imediações do Teatro Guaíra sem o velho chapéu de polaco – aquele com abas cobrindo os ouvidos -, pode virar a folha do calendário: acabou o inverno!

O teste cromático. O céu de Curitiba também denuncia quando o frio se mudou de mala, cuia e casacão. Nesse caso, é preciso confrontar o azul que está lá fora, com o azul do céu de uma tela do falecido pintor Wilson de Andrade e Silva, o Espigão. O azul do nosso inverno é raso. O azul do Espigão é quase profundo, com água batendo um pouco acima da cintura, digamos. Azul assim, acabou o inverno!

O teste do sorvete. Curitibano de média quilometragem também sabe que o melhor sorvete da cidade é o do Gaúcho, na pracinha do Cemitério Municipal. Também conhecida como praça do skate. Praça cheia, todo mundo lambendo delícias, acabou o inverno!

As mocinhas da cidade. No inverno, elas não dançam tão bem. Mas quando elas desfilam no shopping com vestido de alcinha e com o topete resplandecendo, pode tirar pra dançar. Não é a alcinha, é o topete que decreta o fim do inverno!

O teste do avião. Partindo alhures, com destino a Curitiba, e o vôo chega no horário, sem retorno ao local de origem por falta de teto no Aeroporto Afonso Pena, milagre! Acabou o inverno!

Teste da pizza. No inverno, curitibano pede pizza em casa. Com gasosão de gengibirra, é a tradição. Mas se num domingo à noite o restaurante Bavária, quase vazio, de repente recebe um batalhão envergando bermuda, camiseta e chinelão, é Curitiba voltando de Guaratuba, Caiobá e Matinhos. É o fim do inverno!

Para quem passou esse feriadão em Curitiba – de sobretudo, galocha, cachecol e guarda-chuva – melhor que ainda não acabou o inverno. Assim como muitos argumentam que o Brasil não está preparado para a democracia, Curitiba não está preparada para o verão. Nossos gênios do planejamento urbano não planejaram a cidade para 25 graus, muito menos a imaginaram para “senegalescos” 40 graus.

Hoje, 18 de novembro, é dia de Santo Odon – Odon de Cluny – nascido na França em 879. Em sua honra, devemos adaptar uma de suas preces:
“Deus, nosso Pai, sois nosso refúgio, nossa força e nossa vitória. Diante da dor, acarinhai-nos. Na dúvida, esclarecei-nos. No erro, corrigi-nos. Escutai, Senhor a minha oração; atendei a minha voz, suplicante. Neste dia de angústia é para vós que eu clamo, porque vós me responderás: Senhor, acabou o inverno?”.

Dante Mendonça [18/11/2007]O Estado do Paraná.

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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