Amigos

Na caminhada da vida, tive alguns amigos. Poucos, numericamente, mas todos muito queridos, inesquecíveis, com lugar cativo no lado esquerdo do meu peito. Aprendi com Rubem Alves que “a experiência da amizade tem suas raízes fora do tempo, na eternidade. Um amigo é alguém com quem estivemos desde sempre”.

Da pré e adolescência, destaco dois amigos, da velha Araucária de quando o rio Iguaçu ainda era líquido. Do primeiro já lhes falei aqui. Chamava-se José Tadeu Saliba. Foi o que se pode chamar de o primeiro-amigo. Viajávamos juntos de ônibus para o colégio em Curitiba, brincávamos no velho casarão do pai dele, o “seu” Michel, defronte à Praça Vicente Machado, e curtíamos uma pelada diária de futebol, no campinho ao lado de sua casa. Torcíamos pelos mesmos times – Atlético Paranaense e Corinthians Paulista, curtíamos os mesmos heróis das histórias-em-quadrinhos e dos seriados do velho Cine Império. Ingressamos na mesma UFPR, formamo-nos bacharéis em Direito e fomos, ambos, radialistas/jornalistas antes de exercermos a advocacia.

O outro foi Miguel Panek, o Miguelzinho, do qual perdi contato, infelizmente. Mas foi um companheiro inseparável, de todos os dias, que tinha uma missão que só se delega a alguém de absoluta confiança: levar bilhetinhos amorosos à minha então namorada, Cleonice.

Na vida adulta, cito, inicialmente, também dois: Euclydes Cardoso de Almeida. Conhecemo-nos na velha Rádio Guairacá, da Rua Barão do Rio Branco, “A Voz Nativa da Terra dos Pinheirais”. Depois, estivemos na Rádio Cruzeiro do Sul, do Edifício ASA, e, juntamente com Álvaro Alceu de Tulio, palmilhamos as ruas de Curitiba, em passeios noturnos, até o clarear do dia. Mantivemos contato a vida inteira, até Deus levar o nosso Kid para outra dimensão.

O segundo, foi (e ainda é) Luiz Renato Ribas, que a princípio era meu patrão, mas logo virou amigo. Fiz com ele as revistas TV-Programas, Guiatur, Directa e Programas e outras aventuras no mundo jornalístico-cultural. Sempre nos entendemos bem e eu admirava a faísca adiantada de Renato, uma pessoa adiante do seu tempo, apesar da passagem dos anos. É um pioneiro por natureza.

Há ainda um terceiro, que só conheci quando iniciei o período de militância advocatícia: Márcio Augusto Nobre Pereira, então vizinho de andar no Edifício José Loureiro, da Praça Zacarias. Márcio seguiu as pegadas do pai, o saudoso dr. Mauro, e dele recebeu a receita de uma advocacia decente e eficiente, que, mais do que tudo, honra a profissão.

No Tribunal de Justiça, vários colegas logo viraram amigos: Roberto Portugal, Romeu Felipe Bacellar Filho, Edson Dallagassa, Eurico de Paiva Vidal Jr., Norberto Elísio Pavelec, Vilmar Farias, Jacob Holzmann Netto, Alcebíades de Almeida Faria Neto, Mário Montanha Teixeira Filho…

Mas quero hoje destacar apenas um e homenageá-lo em nome de todos os demais: Civan Lopes. Ambos ingressamos no TJ no final dos anos 50, como serventes “extranumerário mensalista, referência XI”. Trabalhávamos na mesma sala, tínhamos os mesmos sonhos e os mesmos ideais. Fizemos a jornada juntos, até chegarmos ao cume da carreira de assessores jurídicos (hoje, consultores) e de diretores de departamento. Levamos o serviço público com seriedade, agimos sempre com presteza no cumprimento do dever e, no tempo certo, aposentamo-nos com a certeza do dever cumprido, com dignidade e competência. Quer dizer: apenas cumprimos com as nossas obrigações, embora nem sempre seja assim.

Por onde passou, na Secretaria do Tribunal de Justiça, Civan marcou presença e deixou a sua contribuição para o aperfeiçoamento do serviço.

Um outro fato levou a estreitar ainda mais os nossos laços de amizade: Raquel, com quem Civan viria a se casar, era amiga de infância, quase irmã, da minha Cleonice. Civan e Raquel e eu e Cleonice estamos hoje casados há 62 anos.

Mais uma coincidência, se isso existe: tanto eu como Civan temos os prenomes criados da fusão de sílabas dos nomes de nossos pais. Eu sou Célio derivado de Alice e de Honestálio; Civan, de Cid e Vanda.

Hoje, no limiar dos 80 anos de idade, gozando as regalias das aposentadorias, acredito que cumprimos um preceito que estabelecemos entre nós, há mais de 60 anos, quase como uma brincadeira: “Não podemos passar por este mundo sem deixar uma marca”.

Modéstia à parte, deixamos.

P.S. I – E aproveito a oportunidade para incluir na lista de amizades um neo-amigo, Roberto José da Silva, o nosso Zé Beto, que, muito mais do que editor, é um novo amigo que eu respeito e quero muito bem.

P.S. II – Com este texto quero desejar a todos, amigos ou leitores, os meus votos sinceros de um Ano Novo repleto de saúde, paz e alegria. Que todos os problemas, angústias e sofrimentos tenham ficado para traz. E que 2024 nasça resplandecente, sem tanta miséria e sem tanta desigualdade social

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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