Cadê as flores, luzes e cores da Lapa?

Já houve alegria na praça da Matriz da Lapa. © Célio Heitor Guimarães

Fazia algum tempo que eu não revia a Lapa dos meus amores. Problemas físicos, desânimo, um tipo que acampou lá, adotando indevidamente o meu nome, e a perda reiterada de parentes queridos afastaram-me de minha terra natal. Dia desses, exatamente uma nova dessas perdas levou-me de volta à centenária cidade.

Cheguei triste pelo falecimento de tio Naldo, o derradeiro filho varão vivo do casal Guilherme e Maria Lorenzen, meus avós maternos, na flor dos noventinha, e só ampliei a tristeza ao pisar no legendário território. O que fizeram com a Lapa?! Onde foi parar aquele recanto bucólico mas feliz, alegre e acolhedor, com tanta história para contar e tanta beleza para mostrar. Cadê as flores, as luzes e as cores da Lapa?

Pensei que havia errado o endereço. Está certo que era um domingo, com o céu nublado e um ente querido sendo velado na capela mortuária. Mas isso nunca foi motivo para que a Lapa escondesse os seus encantos.

Reencontrei uma cidade melancólica, semiabandonada… Não há uma flor na praça principal, os jardins estão descuidados, o casario histórico – patrimônio cultural nacional, cantado em prosa e verso por brasileiros e estrangeiros – padece do esquecimento, desbotado e descascado, cheio de trincas e desprezo…

Como sabem os meus treze leitores, tenho um caso de amor com a Lapa. E não apenas por haver deixado lá o meu umbigo. Muito mais do que isso, a velha cidade me encanta, comove e alegra desde sempre. Oferece-me (ou oferecia-me) uma felicidade mansa, difícil de explicar, só de sentir. Lá tenho enterrado vários antepassados, pessoas queridas, e de lá guardo momentos de profundo sofrimento pessoal. Mas a minha Lapa sempre transcendeu a tudo isso.

Vivi pouco tempo ali, mais nas épocas de férias da meninice e nas visitas a familiares, mas trago a Vila Nova do Príncipe constantemente no coração. Onde fui, por onde andei, sempre levei a Lapa junto. É algo que está além das palavras.

Por isso, o atual estado da cidade me entristece profundamente. Já fora informado de que a tranquilidade, a paz e o romantismo de outrora deram lugar à violência e boa parte dos problemas de uma cidade que quer crescer, mas não sabe bem como. Vi esse filme antes, na vizinha Araucária. Mas achava que, na Lapa, sempre haveria salvação.

Cheguei a idealizar, preparar e montar um livro, que nunca publiquei, exatamente para enaltecer as formas, os ângulos e as cores da Lapa – este, aliás, era o título previsto. Só de fotografias. Sou um fotógrafo amador, a fotografia é apenas outra das minhas paixões. Mas deve ser ao natural, sem filtros e sem retoques. Até porque sempre achei que a beleza da Lapa, da verdadeira Lapa, não precisa de ajustes. Está (ou estava) em cada esquina, em cada pedra de suas calçadas irregulares e, claro, nos casarões centenários.

De todo modo, a despeito dos estragos e do desleixo atualmente existentes, a história continua morando lá, como as lendas, a bravura de tempos idos, a religiosidade, a boa comida e grande parte da civilização paranaense.

Uma nova administração acaba de se instalar na Lapa. O prefeito Paulo César Furiatti está de volta. Aqui de longe espero que, com ele, pelo menos as flores voltem a circundar o general Gomes Carneiro, que se mantém altaneiro no alto de seu pedestal a vigiar a Praça da Matriz de Santo Antônio. Célio Heitor Guimarães

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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