A moda tem dois lados

Clarah-Celso-TavaresClarah Averbuck – © Celso Tavares

A moda tem dois lados. Não, acho que dois é pouco. Deve ter mais, bem mais, mas eu não conheço o assunto profundamente e acho que foi uma boa maneira de começar. Vamos de novo, então.

A moda tem dois lados: a arte e a escravidão. A arte quando vemos todas aquelas belas criações, explosões de cores e criatividade e uma inspiraçãozinha roubada da rua, que ninguém inventa do nada, umas boas idéias e todos aqueles tecidos e aqueles saltos, uma perna atrás da outra, um, dois, flashes, todos aqueles paetês – porque eu gosto de paetês, não sei se nesta estação existem paetês, mas dane-se, porque eu uso paetês quando quero, não quando mandam.

Quando mandam é a escravidão, a parte ruim. Pode, não pode. In, out. Peso, cabelo, maquiagem.

Não, obrigada, eu sei me vestir, ninguém precisa me dizer o que fazer. Estilo e moda, na minha cabecinha de roqueira retrógrada, são duas coisas bem diferentes. Às vezes andam juntas, e é quando funciona. Afinal, os criadores se chamam estilistas, certo? Não modistas. Estilistas. Estilo não sai de moda. Eu acho. Eu acho também que chamaram a pessoa errada para escrever sobre o assunto, mas agora é tarde.

É que eu tenho uma concepção sobre estilo que não combina muito bem com esse negócio de moda por estação. Estilo é algo que engloba a sua cultura, sua personalidade e o seu modo de vida refletidos na maneira como você se veste, e sua cultura e sua personalidade não mudam de seis em seis meses, certo? Isso se você tem uma. Como, vá lá, os hippies, que são péssimos, mas vamos admitir que tinham estilo. Isso lá na época deles, porque hippie fora de época não dá. Não me entenda mal, não quero dizer que uma vez hippie, hippie para sempre. Claro que as coisas passam, mas não tão rápido quanto ditam: elas passam quando passam. Vamos mudar de exemplo, isso tudo está muito confuso. Veja os punks; quando o estilo segue um movimento, um acontecimento cultural e histórico, as coisas fazem sentido.

Mas quando alguém decide, assim, out of the blue, que é hora de usar as polainas dos anos 80, aí eu já não entendo nada. Como não entendo chegar em uma loja e escutar “olha, essa aqui está saindo muito”. Moça, se está saindo muito eu não quero! Por que eu vou querer algo que todo mundo tem? Não, obrigada.

No mundo onde peças exclusivas custam uma grana absurda, prefiro inventar minhas roupas aqui em casa, que é mais barato e menos perigoso, além de muito mais divertido. Porque aqui em casa, a moda só tem um lado: o meu. E é assim que vai ser até o fim dos meus dias, amém.

*Clarah Averbuck, escritora, gosta de estampa de oncinha, tachinhas e olheiras (Somewhere over the rainbow).

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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