Com o nosso dinheiro

Cada decreto estapafúrdio mobiliza um pelotão de gente em Brasília

Até parece que o presidente Jair Bolsonaro recebeu de seus antecessores um país tranquilo, próspero e equilibrado, com a população desfrutando do pleno emprego e os investidores competindo para botar seu dinheiro aqui. Um país tão bem resolvido que o presidente pode dar-se ao luxo de, entre vários disparates diários, concentrar-se numa medida que, por mais rejeitada, ele adora trazer de volta com variações.

É a questão das armas. O jornal O Estado de S. Paulo fez, nesta quarta (26), um levantamento dos decretos de Bolsonaro sobre o assunto. No dia 15 de janeiro, quase que ainda de faixa presidencial, e como se a nação não pensasse em outra coisa, Bolsonaro “flexibilizou” —facilitou— a aquisição de armas de fogo pelos cidadãos, desde que as mantivessem em casa ou em seu comércio.

No dia 7 de maio, insatisfeito, revogou o decreto e soltou outro,garantindo a 19 categorias andarem armadas nas ruas por, segundo ele, se sentirem em risco —caminhoneiros, advogados, políticos, jornalistas, passeadores de cachorro. Abriu também a possibilidade de o cidadão comum adquirir um fuzil e de entrar armado em aviões. No dia 22 de maio, diante da grita, restringiu o porte do fuzil e o de armas em aviões, mas manteve o das 19 categorias, além de permitir que atiradores esportivos —inclusive vizinhos de milicianos nos condomínios da Barra— comprassem milhares de balas por ano.

No dia 18 último, tendo o Senado derrubado os decretos por inconstitucionais, Bolsonaro, prevendo novas derrotas, revogou-os, mas, nesta terça (25), reeditou-os fatiados, esperando que alguns passem, e na quarta (26), outro.

Cada decreto mobiliza um pelotão de homens-hora —assessores, ministros, constitucionalistas, juízes, congressistas— que poderiam estar tratando de assuntos mais urgentes. E tudo isso, como dizem os fãs de Bolsonaro, com “o nosso dinheiro”.

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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