Conheça o rei dos coxinhas

Você aí, coxinha, já ouviu falar de Gene Sharp? Não? Não é possível: afinal, ele é o inspirador dos protestos que você anda fazendo. Pelo menos essa é a teoria que os “bolivarianos” estão espalhando para explicar as mobilizações contra governos que se dizem “progressistas”, como os da Venezuela, do Brasil e, mais recentemente, do Equador.

Sharp, como lembrou no sábado (21) o competente Fábio Zanini, é cientista político e autor de “Da Ditadura à Democracia”, muito citado durante as revoltas da “primavera árabe”.

Rafael Correa, presidente do Equador, desengavetou Sharp, acusando-o de inspirador dos recentes protestos, que ele chama de “golpe brando”.

Começa com a mobilização nas redes sociais, passa para as ruas, e o governo acaba caindo.

O suposto “golpe brando” inclui, ainda, a difusão de boatos nas redes sociais. No caso do Equador, o rumor falava do fim da dolarização, que foi essencial para a estabilidade econômica do país e, por isso, goza de tanto prestígio que Correa a manteve, apesar de sua permanente retórica anti-norte-americana.

Segundo o relato da revista “América 21”, porta-voz do “bolivarianismo”, Correa pôs como exemplo “o que está ocorrendo na Bolívia, Brasil, Venezuela e Argentina, onde setores da oposição tratam de desconhecer governos que contam com respaldo popular provocando mal-estar com o apoio de meios de comunicação de massa”.

Para quem gosta de teorias da conspiração, é um prato feito.

Pena que é uma coleção rematada de tolices.

Primeira tolice: nem Brasil nem Venezuela têm hoje governos que “contam com respaldo popular”.

Segunda tolice: a recente mobilização no Equador não foi obra dos “coxinhas”, mas, predominantemente, do movimento indígena e, nele, do Ecuarunari, assumidamente socialista, que controla 45% da Conaei, a confederação dos movimentos indígenas.

Como sabe qualquer pessoa com ao menos um neurônio, grupos socialistas não se pautam por cientistas políticos norte-americanos —nem os leem, aliás.

Terceira tolice: na “primavera árabe”, na qual a obra de Sharp surgiu para a fama, não houve revolta contra governos com respaldo popular, mas um justo e legítimo levante contra tiranias obscenas.

No Brasil, sou capaz de apostar que nenhuma das pessoas que se mobilizaram contra Dilma Rousseff sabe quem é Gene Sharp.

Alguns querem o golpe no estilo tradicional, não um “golpe brando”. Outros, a maioria, preferem o impeachment, que, estando previsto na Constituição, só pode ser chamado de golpe por energúmenos.

Na verdade, recorrer a uma teoria conspiratória é um recurso tão antigo como o mundo e serve para não encarar as deficiências de governos que se acham messiânicos mas estão acossados pelas ruas.

Que a esquerda tida por bolivariana se deixe fascinar por essa estupidez não é, em todo o caso, de causar admiração.

Ela idolatra um governante, Nicolás Maduro, que diz ter recebido o antecessor (Hugo Chávez) na forma de um passarinho. Não é, pois, um problema ideológico e, sim, patológico.

clóvis-rossi

Clóvis Rossi – Folhas de São Paulo

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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