Culpas e desculpas

Ruy Castro – Folha de São Paulo

Estou esperando um pedido público de desculpas de Mia Farrow

Em 1968, um filme consagrou mundialmente seu diretor e sua atriz: “O Bebê de Rosemary”. O diretor era Roman  Polanski, 35. A atriz, Mia Farrow, 23. Em 1977, Polanski foi acusado pela polícia de Los Angeles de abuso sexual da menina Samantha  Gailey, 13, durante uma sessão de fotografias que ele lhe propusera. Julgado, Polanski foi condenado por estupro, perversão e sodomia com uso de drogas (o sedativo Mandrix) contra uma menor. Admitiu a culpa, mas, antes de ser preso, fugiu para Paris. Está foragido até hoje. Nos últimos anos, surgiram contra ele mais quatro acusações de sedução e estupro de menores, todas referentes aos anos 70.

Em 1995, outro filme, “Poderosa Afrodite”, do já consagrado diretor Woody Allen, revelou outra atriz, Mira Sorvino, 28, e rendeu a ela o Oscar de melhor coadjuvante do ano. Em fins de 2017, Mira Sorvino pediu publicamente desculpas à garota Dylan Farrow, filha adotiva de Mia, por ter trabalhado num filme com o ex-padrasto dela, Woody Allen, a quem Dylan acusa de abuso sexual quando tinha sete anos, em 1992, e Woody mantinha uma relação estável, não conjugal, com Mia.

Estou esperando —sentado, claro— um pedido público de desculpas de Mia Farrow a Samantha Gailey, hoje com 53 anos, por ter trabalhado com um diretor que drogou e estuprou Samantha em criança.

Eu sei, são coisas diferentes: Mira Sorvino trabalhou com Woody três anos depois do alegado abuso, já ciente de tudo, ao passo que Mia trabalhou com Polanski sete anos antes que ele atacasse a garota, donde não teria do que se desculpar. É verdade. Mas, em 2005, num processo envolvendo Polanski e a revista “Vanity Fair” por outro assunto, Mia foi a Londres expressamente para depor em defesa dele.

Proponho que Mira Sorvino derreta seu Oscar e doe o ouro para caridade.

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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