Dia de ação de graças, 28 de novembro de 1986

este-williamagradeço pelo peru selvagem e os pombos passageiros, destinados a virar merda nas saudáveis tripas americanas.
agradeço por um continente a espoliar e envenenar.
agradeço pelos índios por garantirem uma módica dose de desafio e perigo.
agradeço pelas vastas manadas de bisões para matar e depelar e depois deixar as suas carcaças à putrefação.
agradeço pelos troféus de caça de lobos e coiotes.
agradeço pelo sonho americano, por inventar lorotas até que elas brilhem à luz do dia.
agradeço pela klu klux klan. aos policiais que matam negros e os contabilizam. às decentes beatas de igreja com suas mesquinhas, interesseiras, feias e perversas caras.
agradeço pelos adesivos de “mate um viado” em nome de jesus cristo.
agradeço pela aids de laboratório.
agradeço pela proibição e pela guerra contra as drogas.
agradeço por um país onde a ninguém é permitido cuidar da seus próprios problemas.
agradeço por uma nação de dedos-duros.
agradeço, sim, todas as lembranças – ok, deixa eu ver o que você tem nas mãos!
você foi sempre uma dor de cabeça e uma encheção de saco.
agradeço pela última e maior traição do último e maior sonho dos sonhos humanos.

Este poema, dito pelo autor, é a abertura do Documentário William S. Burroughs, A Man Within, 2010, de Yony Leyser. 

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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