Espelho, Espelho

Edward Mãos de Tesoura

Percebo
O quanto parece estar feliz hoje
Amanhã é provável
– quase certo,
Que você fique triste
Por isso vai aproveitar hoje
A tábua de passar roupas
No meio da sala
Uma vitrola da década de 40
Herança do seu inventivo pai
Sempre que você lembra
Seus olhos repuxam numa careta
Apenas evite o delicado confronto
Um corpo diante do outro
Concentre-se na tarefa prática de existir
Com a espada de um dedo afiado
Atravessa o vazio das mangas
Suspende a camisa xadrez
Agora a lâmina longa da mão direta
Sinta a textura do tecido de algodão
Incrível seu gosto por coisas delicadas
Cuidado, Edward
Está tão feliz que pode estragar tudo
Ah, agora você quer dançar
“Traped by a thing called love”
Dance, Edward. Gire, querido
Na sala de espelhos você é mil
Os sofás já estão estourados
Desse salto exausto que você dá
Amanhã você conserta tudo
Esse longo e interminável amanhã
E o desfile das coisas finitas
– diante dos seus olhinhos vítreos
O que é isso, meu querido
Ei, olhe aqui. Nada de tristeza hoje
Você é um menino crescido
Essas lâminas afiadas
E o fio cortante do silêncio
Ah, se eu me aproximar com essas palavras
Não quero nem pensar no que pode acontecer

Assionara Souza – 1969|2018

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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