Houve tempo de liberdade de opinião

Definitivamente, os dias andam sombrios em terra brasilis e, em particular, nesta outrora leal e mui pacífica Vila de Nossa Senhora da Luz dos Pinhais. Leio nos jornais e custo a acreditar: Celso Nascimento – um dos mais decentes, competentes e respeitados jornalistas destas paragens, colunista da Gazeta do Povo e patrimônio da imprensa paranaense, acaba de ser condenado à prisão por haver exercido o seu ofício e exposto a sua opinião!

O juiz Plínio Augusto Penteado de Carvalho, desta nobre comarca, considerou-o culpado por injúria e calúnia e aplicou-lhe a pena de privação de liberdade por nove meses e dez dias, convertida no pagamento de dez salários mínimos, em razão da condição de septuagenário do réu.

Qual teria sido o crime cometido por Celso Nascimento? Escreveu no jornal o que não deveria ter escrito, segundo o eminente magistrado. No cumprimento de sua profissão de informar o público, em texto de novembro de 2014, Celso noticiou que a demora de quatro meses de um parecer do conselheiro do Tribunal de Contas Ivan Bonilha causava prejuízo de meio milhão por dia à municipalidade de Curitiba. O cálculo, com a correção inflacionária, fora feito pelo próprio prefeito Gustavo Fruet. Celso disse também que Bonilha fora Procurador-Geral do município de Curitiba, durante a gestão de Beto Richa e que tinha relações próximas com o já então governador. A demora era verdadeira, a amizade também, de conhecimento público, mas o insigne membro do conselho de sábios do TC, hoje presidente da imaculada corte, sentiu-se ofendido e moveu uma ação criminal contra o colunista.

A defesa de Celso argumentou que apenas houvera exposição crítica de fatos, sem dolo e que o escriba agira escorado no texto constitucional. Debalde. Sua excelência, o Dr. Juiz, ainda que expressasse a sua admiração pelo papel da imprensa na sociedade, condenou o jornalista. Em vão também as reações do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Paraná e das associações Nacional de Jornais, Nacional de Editores de Revistas e Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão, apontando o “grave equívoco”, o “atentado à democracia” e a grave “ameaça à liberdade de expressão”.

Nada foi capaz de convencer o rigoroso julgador. E o ofendido conselheiro Bonilha teve a sua honra garantida por dez salários mínimos.

Curiosa é a vida: a mesma justiça que confere a liberdade, há quase dez anos, a um elemento que, bêbado, na condução de seu potente veículo, em excesso de velocidade e com carteira de motorista vencida, decepou a cabeça de dois pacíficos jovens, manda para o xadrez, com desusado rigorismo, outro cidadão que apenas exerceu a sua atividade profissional, legalmente garantida.

A liberdade de expressão é coisa velha. Vem pelo menos de 1948, com a Declaração Universal dos Direitos Humanos, que em seu artigo XIX, estatui:

“Todo ser humano tem direito à liberdade de opinião e expressão; este direito inclui a liberdade de, sem interferência, ter opiniões e de procurar, receber e transmitir informações e ideias por quaisquer meios e independentemente de fronteiras”.

Quer dizer: qualquer indivíduo tem o direito de manifestar livremente a sua opinião, a sua ideia e o seu pensamento, sem receio de retaliação ou censura por parte de autoridades ou de outros membros da sociedade. Pelo menos era assim até agora.

Pessoalmente, com alguma ingenuidade, por certo, eu comungava da opinião do falecido jornalista Fausto Wolff de que o jornalismo é a profissão mais bonita do mundo porque capaz de dar a oportunidade a um jovem pobre, que tenha amor pelo mundo, pelo país e pelo que acontece a sua volta, de dizer para o povo o que o poder está fazendo.

Como vimos, já não pode. Como afirmei no início deste texto, hoje vivemos tempos sombrios e somente Deus será capaz de saber o que está por vir.

Receba o meu abraço e toda a minha solidariedade, amigo Celso.

P.S. – Não era bem este o texto que eu pretendia escrever às vésperas do Natal. Mas o Menino Jesus há de compreender. Ele, mais do que ninguém, combateu as injustiças, os desmandos e a falta de compreensão entre os homens. Célio Heitor Guimarães

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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