A vida pregressa em vídeos que pesam no currículo

Hoje em dia, no Brasil, para montar um governo é preciso verificar nos currículos o histórico de vídeos produzidos pela figura que vai ser nomeada. Claro que o método não faz sentido em um governo cujo presidente se elegeu exatamente em função dos vídeos mais estúpidos que já se viu na política brasileira, mas, enfim, estou falando da montagem de uma administração dentro de padrões de normalidade, se é que um dia isso ainda será possível neste país.

Ontem, em meio ao alvoroço virtual de uma polêmica sobre o que o presidente Jair Bolsonaro quis ou não dizer em uma curta frase no Twitter, apareceu mais uma encrenca da ministra Damares Alves, desta vez com efeito internacional bastante grave, com um problema provocado por mais um vídeo de pregação em sua igreja. É óbvio que a tendência é de que apareçam outras falas absurdas dessa ministra. Damares funcionava como uma ativista política em suas pregações pretensamente religiosas e a verdade é que na campanha Bolsonaro se beneficiou bastante com o que ela produzia de barbaridades.

O chamado “kit-gay”, por exemplo, como toda a polêmica criada com a educação sexual nas escolas, teve em Damares uma protagonista importante, manipulando informações e passando dados totalmente falsos. Com ela, atuava também seu chefe, o senador Magno Malta, já  concluindo o mandato com o qual foi imensamente útil ao projeto de poder de Bolsonaro, para depois ser repelido pelo presidente. Eles são todos parte de um enredo fraudulento. Ora, que país é esse onde o presidente da República ganha a eleição enfiando o dedo de forma obscena no orifício da página de um livro de educação sexual e fazendo disso o centro do debate em um país metido na sua pior crise econômica e moral?

O novo quiproquó da ministra dos Direitos Humanos é um vídeo onde ela diz que pais holandeses são instruídos a “massagear sexualmente suas crianças”. Vamos à sua fala: “Inclusive na Holanda, os especialistas ensinam que o menino deve ser masturbado com sete meses de idade para que, ao chegar na fase adulta, possa ser um homem saudável sexualmente, e a menina deve ter a vagina manipulada desde cedo para que ela tenha prazer na fase adulta”.

Nós brasileiros não nos impressionamos com essas coisas, por causa do desmonte político e cultural que faz de uma fala dessas praticamente uma normalidade. Mas o vídeo causou indignação entre os usuários do Twitter holandês. A imprensa holandesa também repercutiu o caso e não é improvável que venha da Holanda um pedido de explicação oficial desse governo que provoca vergonha alheia internacional. Afinal, embora seja uma idiotice completa, a fala é de uma ministra de Estado.

Numa matéria do site UOL, sente-se o reforço da sensação de que estamos convivendo no Brasil com uma realidade política que não faz sentido, perdendo tempo em discussões sobre assuntos completamente idiotas. O site ouviu uma jornalista holandês, Sandra Korstjens, que disse o seguinte: “Muitas pessoas acham difícil acreditar que ela realmente falou isso, porque é tão absurdo”. E a jornalista tem toda razão. É realmente inacreditável que estejamos vivendo algo como esse governo Bolsonaro. No Brasil atual parece que acordamos todos os dias em um pesadelo. E o mais constrangedor é que essa foi a vontade da maioria dos eleitores. Pior ainda, a outra opção eleitoral poderia ter deixado o país numa situação ainda pior.

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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