Rubens Costa

Na orelha: Quando Rubens Costa me presenteou  este   seu  romance policial, perguntei a mim mesmo por que ele enveredou por tal caminho, tendo sido sempre o poeta piauiense que escava   poemas   no   âmago   da   alma nordestina, na trilha de Torquato Neto e João Cabral, que produz autos teatrais ao estilo de Ariano Suassuna e que nos faz escutar suas palavras com orelhas abertas. É preciso saber que de lá vem uma claridade indecente, o  calor do  asfalto parece  suar e embaça o ar, transborda agonia. Sua-se com o ato de acender um cigarro; a cada novo pensamento; sua-se até  com a vontade  de nada  fazer, um sentimento equatorial mais primitivo que a preguiça.

O que faz sentido é a expansão da poesia através da estória e da trama. O suspense não deixa de provocar o prazer aflitivo que dele se espera, e ao mesmo tempo é apenas uma escansão poética, uma porta de entrada para o que temos de melhor e de pior. É nisso que estamos como Dante no inferno: pois é poeti-camente que nos são apresentados os personagens mais sórdidos e mais sublimes do submundo de Teresina, seja o porco estuprador de meninas, o policial, o jornalista, o político e o juiz corruptos e corruptores, a degradação do sexo enquanto meio circulante para obter o dinheiro e o poder. O nosso anti-herói ro-seano vive muito perigosamente, e por vezes quer voar pela janela e escapar da morte, sentado num pequeno ponto de luz no infinito. Ele sabe que, ao segundo esturro do caipora, “… a coragem não é moradeira.”

A morte do pai, “o acontecimento mais importante da vida de um homem” (Freud), aqui se resolve como lembrança de amor, já que é impossível combater os pequenos bichinhos invisíveis que devo-ram o seu corpo, saqueando-o para que a vida possa deixá-lo sem saudades. E abre as portas para o amor da filha, feito da insistência, da necessidade de uma pre-sença generosa, infantil e adulta ao mesmo tempo, essencial para resgatar a fé e o ânimo.

A mulher e seus diversos nomes com¬parecem então num erotismo vibrante, pois ela sempre quer o último gozo, abafar o calor de dentro das pernas. Um desejo cuja intensidade precisa ganhar tempo, precisa respirar, que arranca a roupa dela e come o seu corpo quente, ela dócil, insegura de apaixonada… o coração lateja e o leitor é imediatamente sensível ao recon-forto masculino primitivo. E não importa que seja o do velho que precisa da prisão daquelas coxas.

O poeta e o homem estão maduros. Uns poucos sabíamos que tínhamos um ótimo escritor, e a Garamond enseja agora que outros possam usufruí-lo.

Paulo Becker

Conheci  Rubens Costa no Clube dos Diários, em Teresina, no Clube do Vinil. Primo da artista plástica Fátima Campos, ele é nefrologista, toma muita cajuína e além de divertido, é um contador de “causos” de primeira. Na dedicatória, escreveu: “Para Sol-da-Vera um romance solar”. Solda

Dante no Inferno|romance|Sermograf|Petrópolis|abril|2007|128 páginas.

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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