Trocadilly

Trocava um pouco as coisas. No restaurante chinês pedia carne de porco and bess e chop schinitz. Mas, até aí, tudo bem. Já na Irlanda, pensou que recebera uma cantada da Ira Furstenberg e eis que não passava de uma emboscada do I.R.A. Jogado ao mar, tini tanta sorte que foi dar numa praianinha muito calma, onde pastava um cavalo branco, não, preto, quero dizer, sim, zaino. Embora tremapé, arrastou-se como pode, cobrindo as borgonhas, até que encointreau um velho contrabandista, daqueles que opera no maior underberg, Como era boa pessoa, kirsch ajudá-lo e conduziu-o a um imenso castelo, o Château Lafite.

Ao invés de tomá-lo de mersault, como imaginara o moço, o old smugler indicou-lhe a champanha e disse: Tokay! Obediente, o jovem respondeu gin e fizz isso, provocando o aparecimento à porta, digo, ao porto, de uma mulher amada que logo lhes ofereceu leite. Recusaram porque não era de premiers crus e já estava um tanto merlot. Contentou-se, o nosso atrapalhado herói, chianti da insistência da moça, com um prato tipo queijo de beefeater com fritas, que comeu com grande gula embora fosse até bem magraux. Já o seu acompanhante, que puxava mais sobre o gordon, fazia uma appellation controle pra cima da cozinheira, que se chamava Bloody Mary ou Maria Sanguinária, se preferirem. Ela era, em que pese o nome e o aspecto brut, uma autêntica angostura com sua ferreirinha de pulso enfiada no braço. A esta altura, os dois só iam. Diga siga, gritava o contrabandista. Estou grogue, respondia o moço, steinhager um pouco aquela destilação. Como já era tarde da noite, decidiram se acampari por lá mesmo. Um gato preto ron ron nou enquanto um merino lanudíssimo aguardava a vez de entrar na tequila.

Vestindo um ponche de arrak, o old smugler aproveitava-se agora de uma pobre caipirinha que aparecera por acaso, eis sifão quando entra no aposento um ser, veja, que mais parecia um corvo velho com bourbon de três dias. Ihou-os ambassador, fez menção de sauer, deu meia vodca e um soco na porter, afirmando que não trabalhava para viúva que fazia clicquot. Absinto que ele vai nos manhattan, sussurrou apavorado o moço que trocava as coisas. E acrescentou: Estou com um medoc danado. O contrabandista não parecia perturbado: Este cara tem um jeito sauterne mas não passa de um tremendo beaujolais. A mãe dele era punta y mesmo, arrematou frisante. Ao ouvir o insulto, o velho corvo ficou vermouth de cólera e ergueu o pernod à frente. Em um pisco de olhos, encostava na fernet branca do moço o cano negroni da sua pistola. Tinha o rosto esburacado, como se houvesse contraído valpolicella. Daiquiria muito e ameaçava a vítima: Vou te fazer uma sangria, vou te levar pro jerez. Lacrima Christi, exclamava o jovem. Toma uma atitude aí. É o kümmel se… este… es… pan… talho nos liquido… ar.

Percebendo que o tempo torneira-se quentão, o contrabandista ergueu-se, agitou, mexeu, bateu o corvo velho com força, não coou nenhum golpe, reduziu-o a um amontilhado de ossos – e acabou jogando o copo fora. Ao gê-lo picado, voltaram licores à face do rapaz, que, convenhamos, cumpriu seu calvados, porém vinho um pouco verde para enfrentar esta história. E por pouco não a strega toda.

Armando Coelho Borges (1937-2013) do Livro QI 14, Coleção Guaipeca, Editora Guaratuja, 2ª Edição, 1975.

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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