Lima Barreto e o guru que sabia javanês

Olavo de Carvalho pelejou a vida toda para ser reconhecido como filósofo. Pois não serve nem para indicar alguém qualificado para um cargo público. E não sou eu quem está dizendo. Foi o presidente Jair Bolsonaro, que ao confessar que a escolha de Ricardo Vélez Rodríguez para o Ministério da Educação foi feita de qualquer jeito, revelou a ineficiência de Olavo, o guru da família Bolsonaro, que formulou as bases, digamos, intelectuais, para o surgimento das atuais forças de direita na política brasileira, com a eleição de Bolsonaro.

O presidente está na capa da revista Veja desta semana, onde ele finalmente confessa que foi um erro a nomeação de Vélez Rodríguez, que foi indicado pelo polêmico professor da Virgínia. Quando percebeu o erro, Bolsonaro diz que ligou para Olavo para pedir explicações. A conversa é depreciativa para a condição intelectual do pretenso filósofo. Veja como se deu o diálogo, conforme contou o presidente à revista:

“Bolsonaro – “Olavo, você conhecia o Vélez de onde?”
Olavo – “Ah, de publicações.
“Bolsonaro – “Pô, Olavo, você namorou pela internet?”

Foi dessa maneira que se encerrou um dos grandes erros do governo Bolsonaro, numa das pastas mais importantes do governo brasileiro. Torna-se uma piada da história brasileira recente que a desastrosa escolha do nome de Vélez Rodríguez para a pasta da Educação tenha vindo de alguém que por décadas vem apontando a falta de qualidade na educação no Brasil, enveredando por críticas ideológicas e extremamente agressivas, nas quais não poupa ninguém do setor, usando para isso pesadas ofensas, especialmente para professores do ensino superior.

É interessante que venha do próprio Bolsonaro, na sua linguagem peculiar onde ele costuma encaixar a imagem do “namoro”, a avaliação do método de Olavo de Carvalho, que o coloca numa condição curiosa que me lembrou o protagonista do conto de Lima Barreto, “O homem que sabia javanês”, sobre alguém que era muito admirado pela sua sabedoria, que consistia em saber javanês. Porém, esta língua nunca existiu.

A figura do conto tinha a fama de saber o idioma e vivia desse prestígio. É uma obra-prima desse nosso grande escritor, que em poucas páginas traça o perfeito retrato sobre um tipo social muito influente na vida brasileira, desde os tempos de Lima Barreto — que viveu de 1881 a 1922 — até agora. São aquelas pessoas que sobem na vida a partir de conhecimentos que na verdade são falsos. No Brasil existe muita gente que sabe javanês, uma habilidade que por sinal é muito útil na política. Serve até para se eleger para a Presidência da República. Ou para virar o guru do presidente.

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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