Milton Ivan Heller, adeus

A notícia veio pela rede social: morreu o jornalista Milton Ivan Heller. Recebi-a ontem à noite, pouco antes de dormir, passada por quem navega na internet. Quem enviou foi outro amigo – e também jornalista, Jaime Lechinski. Se conheciam do tempo em que o Jornal do Brasil tinha uma sucursal que, com uma equipe excepcional de repórteres, só nos faz ter saudade dos anos 70 e início dos 80.

Hoje não há mais nada, apenas recordações. Heller é o responsável direto pela vinda do signatário para a capital da província. Era repórter da sucursal da revista Placar, atleticano até a medula, como só aconteceu desde que a revista foi fundada em 1970 e encerrou as atividades semanais vinte anos depois. Recebeu o convite para fazer parte do time do jornal carioca. Foi sem pestanejar. Em São Paulo o diretor Jairo Régis abriu espaço para o estagiário. Salvação da lavoura, pois estava casado, com o primeiro filho a caminho e ganhando o piso. Seis meses antes da mudança, conheci quem iria substituir quando cobri férias dele. Conheci da melhor maneira: fui à sua casa, na Vila Hauer ou perto dali, onde tinha um quintal enorme e, surpresa para quem morava num porão na Moóca, na zona leste de São Paulo, criava galinhas que, quando vi, ficavam soltas no enorme terreno do outro lado da rua. Fotografei o galo – e mantenho no arquivo os slides daquele belo encontro. Milton Ivan sempre foi de briga. Pelo que entendia de justiça ao ser humano. De esquerda? Sim. Romântico? Sim. Corajoso? Bota coragem nisso.

Foi perseguido pelos gorilas da ditadura militar e sobreviveu na batalha. Escrevendo, porque a arma que tinha era essa. Além da Placar e do Jornal do Brasil, passou pelas redações do Estado do Paraná, Diário da Tarde, O Dia, Diário do Paraná, Rádio Cultura, Panorama, sucursal do jornal Última Hora, Rede Globo de Minas Gerais. Encerrou a a carreira em 2001. Encerrou? Quando lhe fecharam as portas das redações, por ter convicção e, pecado dos pecados para os obtusos do outro lado, pertencer ao Partido Comunista do Brasil, foi vender livros de porta em porta para sustentar a família e, quando os militares voltaram aos quarteis, se debruçou sobre a história que conhecia e dá-lhe escrever livros. A saber:  “Conspiração Nazista nos Céus da América”, “Os Índios e seus Algozes”, “Valmor Weiss: o Prisioneiro da Cela 310” e “Atualidades do Contestado”.

Sócio do Instituto Histórico e Geográfico do Paraná, ele foi homenageado  pela Câmara Municipal de Curitiba em março de 2014 com o “Prêmio Cultura e Divulgação”, proposto pelo também jornalista e então vereador Jorge Bernardi. Tinha 82 anos. No dia seguinte lançou, na Biblioteca Pública do Paraná, o livro “A CIA e a Quartelada – os 50 Anos do Golpe de 64”. No último telefonema, convidou seu sucessor na redação da sucursal da Editora Abril para uma festa de aniversário. Naquela noite o céu se abriu e caiu um dilúvio em Curitiba. Não pude ir. Ontem ele partiu. Está sendo velado e será enterrado hoje às 17h no cemitério Jardim da Saudade. Amém.

Zé Beto

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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