Mixórdias incompreensíveis

Bolsonaro tem péssima dicção; Lula era língua presa

Entra presidente, sai presidente, e os funcionários das embaixadas brasileiras no exterior continuam sofrendo. Nossos governantes precisam viajar de vez em quando e, como não são obrigados a falar outra língua —nenhum governante é—, dependem dos intérpretes para conversar com seu colega estrangeiro ou com a imprensa local. Esses intérpretes, se forem do velho Itamaraty, são fluentes nas línguas internacionais e competentes na dos países em que servem. O problema são os presidentes. Além das asneiras que dizem, quase todos têm péssima dicção.

Jair Bolsonaro, pelo que já se viu e ouviu, é um desastre vocal. Fala depressa demais e suas consoantes atropelam as vogais, numa mixórdia quase incompreensível —é como um trem descarrilado, com os vagões, no caso, as sílabas, amontoados uns sobre os outros. Às vezes, desiste de uma frase pelo meio e a substitui por outra, que, idem, não conclui. Esse suposto à-vontade não quer dizer segurança ou desembaraço, mas desleixo, mesmo.  Ou contratam uma professora como Glorinha Beutenmüller para ensinar Bolsonaro a falar, ou seus intérpretes terão de pular miudinho.

Não é só Bolsonaro, claro. Lula era língua presa —ainda é. Seus esses soam como efes, tipo “Eu fó queria faber, eu fou ou não fou o dono do fítio?”. Imagine-o, em presidente, falando com Mugabe, do Zimbábue, Maduro, da Venezuela, ou Ali Bongo, do Gabão, e os intérpretes tendo primeiro de traduzi-lo para o português antes de vertê-lo para seus ditadores favoritos.

Já o problema de Dilma eram os absurdos que dizia, como “Depois que a pasta de dente sai do dentifrício, ela dificilmente volta pro dentifrício”. E o de Temer é o conteúdo zero com os pronomes certos —suas falas são um vácuo, não dizem nada.

E Fernando Collor? Posso calcular o suplício do intérprete se ele dissesse lá fora o que, certo dia, disse aqui: “Eu tenho aquilo roxo!”.

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
Esta entrada foi publicada em Ruy Castro - Folha de São Paulo e marcada com a tag , , . Adicione o link permanente aos seus favoritos.
Compartilhe Facebook Twitter

Deixe um comentário

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.