O homem que acabou com a Lava Jato e suas complicações eleitorais

Jair Bolsonaro afirma que vai anunciar seus candidatos nas eleições municipais duas semanas antes das eleições. É mais um recuo, pois antes havia dito que ficaria neutro na eleição deste ano, o que politicamente não faz sentido para qualquer governante, ainda mais no seu caso, de um presidente que já quase no meio do mandato, para ter uma sustentação partidária própria ainda precisa construir tudo.

Bolsonaro não tem uma base sólida nem em Brasília, sequer conseguiu formar um partido, nem tem figuras de destaque nacional a seu lado. Ele perdeu todas as bandeiras de campanha que convenceram os eleitores na eleição presidencial, além de se transfigurar naquilo que foi demonizado por ele e os fanáticos que o acompanhavam na campanha passada .

Sobrou alguma proposta que Bolsonaro possa levar ao eleitor nas cidades brasileiras? Eu desconheço. Até com a corrupção ele já acabou. O sujeito é mesmo um fenômeno: fez isso em parceria com Ricardo Barros, Roberto Jefferson, Renan Calheiros e outras figuras notórias.

Francamente, acho difícil alguém querer ficar do lado do sujeito que se orgulha de ser o destruidor da Lava Jato. Neste caso, Bolsonaro vai disputar com Lula a conquista de seguidores. E por mais popularidade que ele tivesse como presidente, um candidato a prefeito ou a qualquer outro cargo também não terá uma grande vantagem com um apoio que, conforme anuncia, chegará apenas duas semanas antes da eleição.

Numa eleição, o candidato precisa de estrutura política e material, organização, entrada política na sociedade civil e até meios políticos para fustigar os adversários ou diminuí-los com críticas e comparações políticas. Isso leva tempo para ser construído.

Duas questões importantes da eleição passada, segurança pública e corrupção, permanecem na ponta como preocupação dos brasileiros. Bolsonaro só poderia ser um diferencial positivo nestas questões se levasse com ele o ex-juiz federal Sérgio Moro aos palanques nos municípios. Na companhia de Dias Toffoli, Gilmar Mendes, Augusto Aras ou mesmo Kássio Marques, eu creio que ele teria dificuldade até de ser recebido no aeroporto mesmo por corruptos locais, que, como se sabe, preferem certas companhias apenas na obscuridade dos bastidores da política.

Bolsonaro não compreende sua situação política. Não tem a mínima capacidade intelectual e política para isso e carece também de experiência em liderança. Por três décadas a única coisa que liderou foi a lucrativa carreira de cada filho, que não tiveram uma boa gestão, conforme pode-se observar pelos avanços das investigações da polícia no rastro dos pacotaços de dinheiro vivo. Seu comando desastroso pode ser avaliado pelo tremendo prejuízo colhido exatamente no ápice da sua carreira, com os desmontes da base política com a qual poderia estabelecer um poder pessoal e solidificar a imagem construída na última eleição.

Falta-lhe até um partido, um complicador a mais nesta e nas outras eleições e que pode servir para demonstrar que é balela seu pretenso poder pessoal para arrebatar apoios. Não conseguiu criar uma equipe capaz de tocar uma estrutura administrativa e política para a construção partidária.

É impossível criar uma unidade de discurso, centrada na sua figura. Mesmo o que ainda restou dos militantes que deram sustentação à construção da sua candidatura está hoje pulverizado, com seguidores sendo obrigados a usar outra siglas até para disputar vaga de vereador. O seu “partido”, chamado de Aliança pelo Brasil, só tem nome e logotipo, por sinal muito ruins. Como partido, o tal do “Aliança” é nada mais que um fake news.

Ele não conseguiu nem juntar assinaturas para o registro do Aliança, algo que já foi feito até por políticos desprezíveis — como o dono do PSL, que ele foi obrigado a abandonar —, sem o alegado carisma desse que cada vez menos seguidores chamam de “mito”. É ridículo o número de assinaturas que Bolsonaro conseguiu. Com nove meses de campanha para tentar o registro no TSE, em período sem o desgaste político atual, recolheram 15.762 assinaturas consideradas válidas. Ou seja, 3,2% do total necessário para funcionar legalmente como partido, que é de 492 mil eleitores.

De tanto falar em Lula e no PT, parece que Bolsonaro passou a acreditar no mito da popularidade instantânea de Lula, na ilusão criada por petistas muito espertos de que basta Lula querer, para que as coisas aconteçam. Nunca foi tão fácil assim. O PT cresceu a partir de uma capilaridade muito grande, abarcando gradativamente sindicatos, muitos deles totalmente aparelhados para a batalha eleitoral, cativando o meio intelectual, artistas e parte fundamental da imprensa, associações civis e até movimentos sem constituição legal, uma máquina que servia não só para fazer crescer o poder do PT e fazer de Lula um mito, com também para fustigar adversários durante as eleições.

Jamais bastou levar Lula a um palanque para que ele decidisse a eleição com sua popularidade. Era preciso antes construir o palanque, criando não só a base de apoio como a artilharia contra candidatos adversários, nem que fosse enchendo os calçadões das cidades com as barracas de lona preta do MST na frente de bancos.

A condição hoje em dia de Bolsonaro é completamente diferente. O presidente não tem estrutura e ideário para dar sustentação a palanque algum. Achar que basta colocá-lo em cima de um caminhão para conquistar a vitória em algum município brasileiro é certamente uma história que, mesmo com sua incapacidade, nem ele leva a sério.

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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