O homem que entrevistou Dalton e outras histórias do Araken – conclusão

Araken Távora, Antônio Callado e Fernando Gabeira desembarcaram cedo em Brasília. Um motorista se aproximou de Callado e disse: “Por aqui, excelência!”. Callado e os outros entraram no Opala preto. O motorista, sendo gentil, perguntou se era pra ir pro Estado Maior das Forças Armadas. Callado, pensando que a última vez que esteve numa das dependências das Forças Armadas foi quando puxou cana longa depois do AI-5, respondeu: “Não. Vamos para o Hotel Nacional”. O motorista tocou pro hotel. Desembarcaram e o Callado disse ao motorista: “O senhor está dispensado. Volte às 18 horas”.

O motorista replicou: “Estou à sua disposição. Aguardo aqui até às 18 horas”. Callado ainda perguntou se ele não iria almoçar, recebendo a resposta que tinha ganho diária e iria se virar. Seis da tarde, descem e pegam o carro, pedindo ao motorista que lhes deixe na UNB. O sujeito obedeceu cegamente. Terminado o Encontro Marcado, voltaram ao carro e pedem para ir ao Palácio do Buriti, onde o governador José Aparecido lhes esperava para um jantar.

Já era quase duas da manhã, jantar terminado, estavam batendo papo com o governador. Foi quando explodiu uma confusão com vários gritos e ameaças. Desceram todos aos jardins do Palácio. O cenário era de guerra. Um coronel da Aeronáutica, acompanhado por fornida tropa, ameaçava invadir o Palácio para prender o desertor que havia abandonado um brigadeiro no aeroporto pela manhã. A tropa, com os fuzis apontados, ameaçava a invasão. O oficial de plantão da PM do DF, cioso dos seus deveres de proteger o Buriti, também tinha postado a tropa, com os fuzis apontando para o pessoal da Aeronáutica. Uma fagulha e o Palácio ia pegar fogo, com vários mortos de lado a lado. José Aparecido tomou conta da situação, desarmou, literalmente, os soldados de ambas as tropas, e esclareceu o equívoco: o motorista, numa infeliz coincidência, havia confundido Antônio Callado com o brigadeiro, tudo pela cor do terno. Disse que iria telefonar para o ministro da Aeronáutica e aclarar tudo. O coronel da Aeronáutica se acalmou. E Aparecido esclareceu tudo com o ministro.

No final da história, o motorista, ainda chorando, abraçou José Aparecido e disse-lhe: “Governador, muito obrigado. O senhor salvou a minha vida”. O governador indagou: “Mas você não notou nada de estranho?”. O sujeito, que continuava chorando, respondeu: “Governador, eu sou sargento-motorista há vinte anos e sempre cumpri as ordens de qualquer oficial, ainda mais brigadeiro, sem indagar qualquer coisa!”. Recompondo-se, o motorista ainda teve tempo de dizer, apontando para o Fernando Gabeira: “Na verdade, eu percebi que havia algo de muito estranho. Nunca vi brigadeiro entrar no carro oficial com um v…. comunista!”.

Araken Távora, recém chegado ao Rio, engatou um tórrido romance com a grande cantora Maysa. Maysa tinha turnê marcada pelo Brasil e o Araken seguiu atrás. Nos teatros, enquanto Maysa cantava, Araken ficava nas coxias tomando uísque. Quando batia a sede, Maysa clamava pelo Araken que entrava no palco com um copo cheio do líquido que Maysa sorvia e depois continuava o show. Bela noite, num teatro do Nordeste, a cena se repetiu. Um conhecido do Araken, dos tempos de Londrina, reconheceu a figura e gritou: “Dai, Araken! Tudo bem?”. Com a escuridão da plateia, Araken não reconheceu quem era e respondeu: “Tudo bem! Quem é?” “É o Tonho, filho do Geraldinho da Farmácia!” Aí começaram um longo diálogo rememorando o passado. A plateia, que no início não estava entendendo nada, caiu na gargalhada. O show continuou com a Maysa, no meio das músicas, interrompendo as canções para rir. O Aramis sempre contava essa história.

Um belo dia, a Hermínia deixou de ser Amélia e tocou o Araken de casa. Aramis Millarch, na sua coluna de 7/1/1992, escreveu: “Entre 31 de dezembro e o início de 1º de janeiro, Araken morreu no Rio de Janeiro. Sozinho, em uma noite em que oficialmente todos tinham a obrigação de comemorar. Comemorar o que? Anjo da morte, que desce em dezembro, levando pessoas tão queridas, levou também Araken Távora!”

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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