O rio

O rio é uma correnteza que começa mínima num local chamado nascente, onde haja um manancial. No início, por haver menos resíduos nas redondezas da fonte, ele segue como um córrego, carregando as poucas impurezas que encontra, largadas ocasionalmente por gente que sobe até onde ele nasce. Depois, à medida que vai descendo, recebe mais porcarias e restos e sobras das pessoas que vivem junto ao seu curso. Aí, com um volume maior de coisas atiradas nele, vira riacho. Continua a descida, atravessa vilarejos, se aproxima das cidades.

Aqui e ali, tenta uma corredeira mas é sempre alcançado pela sujeira. Então circunda instalações industriais, que despejam nele grande fluxo de detritos. Assim, em seu trajeto de dejetos, avança manso e triste, já é um rio pleno de nojeiras borbulhantes, com seus afluentes de detergentes. Mais adiante, já largo e coalhado de insalubridades, passa a ser abastecido por correntes contínuas de esgoto vindas de todos os lados. Corrosivo, rasga lentamente a crosta de podridão para seguir rumo ao estuário. Na foz, cercado de monturos fedorentos e pestilentos, tenta vencer as últimas barreiras insalubres, na ânsia de encontrar o alívio final, para o qual correm todos os rios. Sem forças nem para marolas, deságua suas toneladas de sacos plásticos num infinito depósito de imundícies. O rio chegou, enfim, ao maior lixão do planeta: o mar.

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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