Permitam-me envergar um latinório. Duas razões. Uma, o texto escorreito de Célio Heitor Guimarães (escorreito quem ainda usa é o delegado Reinaldo de Almeida César para elogiar o povo do ZB). Outra, a sentença do juiz Marcelo Bretas, que condenou o ex-governador Sérgio Cabral a 45 anos de cadeia por roubalheira explícita, acintosa, obscena e agravada.

Latinório? Duas palavras, obiter dictum, no singular. Significa aquilo que se diz na condução de um raciocínio, que o reforça retoricamente sem ser elemento decisivo na conclusão. Os juízes usam-no a todo tempo, até falando o que não devem. Vide Gilmar Mendes. O que vem ao caso está na sentença do juiz Bretas, que nos obiter dicta, plural, afirmou, como segue.

Que a mulher de Sérgio Cabral, a advogada Adriana Ancelmo, era “mentora” da roubalheira do marido. Mais, que a ex-primeira dama extraiu “prazeres” do peculato. Precisamos entender o magistrado: ele é evangélico, leitor regular da Bíblia, que cita nos seus dicta. Mais um pouco e o juiz chamaria Adriana de Jezabel, a cortesã fenícia que corrompeu o rei Acabe, de Israel.

Ainda que não pareça, há tempo o juiz Bretas se põe como contraponto a Sérgio Moro, homólogo na toga e na cinematografia Lava Jato. Moro, um tipo Balas Zequinha; Bretas, o discreto herói que some depois de salvar a mocinha. Como tenho apenas alguns parágrafos para encerrar deixo estas obiter dicta.

O juiz Bretas manda um recato às mulheres que se servem dos maridos para aparecer: são mentoras de suas ações e extraem prazer na vida pública dos cônjuges. No tom evangélico, carregado no toque moralizante. Recado só para a doutora Adriana? Não, também para outra doutora, Rosângela Moro, a mulher do colega da Lava Jato primeira e referencial.

Não diria que Rosângela seja mentora do marido, exceto na roupa de mau gosto, visível contravenção estética. Mas frui prazer na morofilia, a começar pelo Facebook ‘Eu Moro com ele’, o trocadilho outra contravenção; o ‘eu’, indisfarçado narcisismo. Pior: a entrevista-capa da revista Cláudia! Como é que um juiz não tasca um interdito proibitório em casa?

Bretas tem suas razões extra evangélicas e extra judiciárias. Não consegui reproduzir a foto dos casais Bretas e Moro no lançamento do filme da Lava Jato. As fotos valem por mil palavras: a mulher de Moro em primeiro plano, sempre à frente do marido, roubava as cenas e os flashes do marido, do juiz Bretas e da mulher deste, Simone Bretas.

Simone é juíza federal. Uma bela mulher, alta, curvas exuberantes de carioca, elegância discreta, bem cuidados cabelos loiros de farmácia. Lembra Flávia Alessandra, a atriz que faz a delegada no filme. Preciso dizer mais? Uma coisa: na escada rolante do cinema, Simone dirige a Rosângela aquele olhar de despeito só encontrável nas mulheres rivais.

A doutora Rosângela Moro não precisa ser bela, nem do lar. Mas um certo recato ajudaria. Entre a mulher de César e a de Temer, Marcela é a referência no recato republicano. O juiz Marcelo Bretas, lá nos esconsos escaninhos do inconsciente evangélico, foi iluminado pelo profeta Elias. Quanto a mim, lembro as palavras do Senhor: “a letra salva e o espírito vivifica”. Amem. 

Rogério Distéfano

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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