Vinicius Comoti

O órgão muscular de Vinicius Comoti (bruxo, cineasta, curandeiro e membro da Associação dos Poetas Rupestres de Ourinhos) situado na cavidade torácica entre os pulmões, num espaço denominado mediastino, também chamado coração (presente nos humanos e em outros animais) bombeia o sangue através dos vasos sanguíneos do sistema circulatório.

O sangue fornece ao corpo, nuvens, árvores, céu estrelado, sangue, suor e lágrimas, sobremesas, ervilhas, bailes de debutantes, Nina Simone, sempre cantando I put a spell on you, amores inesquecíveis, duplicatas vencidas, boletos, nutrientes, livros comprados em sebos, brioches, medalhinhas de São Jorge, autógrafos de Marilyn Monroe, elimina resíduos metabólicos, desafetos, parentes distantes, trovoadas e chuvas intensas, ajuda na formação da última flor do lácio – inculta e bela e a cena final de Hamlet, além de beijos, gritos e sussurros.

Sangue do meu sangue, sangre, insiste sempre Vinicius Comoti, no cio. Seus manuscritos, sempre em tábula rasa, gritam rasga, coração!  Mas o coração não lhe dá ouvidos e segue em frente, cumprindo a árdua tarefa de bater, bater, normalmente de 60 a 100 vezes por minuto. Bate bem o coração do poeta, mas sempre apanha no final, mas aí já é outra conversa. Então vem o verso, o reverso da mesma moeda, e Vinicius, em plena madrugada, entoa cânticos às paixões, mordiscando o bico do peito da ninfeta de cabelos ao vento. Longe dali, ali mesmo, o menino transverso, perverso, ejacula sonetos irreverentes, ruborizado. Na escuridão, ouve o canto da cotovia, prece clara e jubilosa. E vice-versa. Luminoso vaga-lume brincando com as constelações, numa bioluminescência eterna.

Vinícius mostra que os mortais têm a liberdade e habilidade dos deuses, divertindo-se com os afazeres da vida cotidiana cometendo pecados imortais, pagando tudo com a própria vida, já que a morte não deixa por menos. E mais: todos os seus versos, um por todos, e todos por um, só têm um compromisso: a poesia. Dou minha palavra. E não aceito de volta.

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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