Amanhã será outro dia

Rogério Distéfano – O Insulto Diário

DO RIDÍCULO AO PATÉTICO. Foi o trajeto do PT no julgamento de Lula.

Primeiro, o comportamento: o partido continua sob os dogmas do destino manifesto e da infalibilidade de Lula. Ou seja, qualquer condenação judicial ou derrota política é a negação das benesses que trouxe ao país e a afirmação de atos de corrupção por seu líder é algo de gravidade equivalente à de negar a imaculada conceição (a virgindade da mãe de Cristo, viu, senadora presidente).

Segundo, o comportamento que raia o infantil de achar que numa democracia demonstrações de massa acuam os poderes estabelecidos: Lula ignorou a dignidade de ex-presidente e se mandou para a Porto Alegre a fazer comícios para intimidar os juízes do TRF, um comportamento pelo menos mais evoluído que o na antológica foto de sua campanha contra Fernando Collor, na qual aparecia com ar compungido ao lado da filha Lurian, que o adversário – mais tarde seu aliado – alegara em campanha que o pai, Lula, havia rejeitado na gravidez da mãe.

A sentença de condenação foi confirmada pelo tribunal. Aqui ingressa a ignorância, crassa ignorância, da liderança do partido, sobretudo de sua presidente – esta assina com todas as digitais o atestado. De novo, aquilo de constranger o tribunal, até com os argumentos do advogado. Qualquer advogado sabe que por mais aguerrida seja sua defesa do cliente ela nunca se faz agredindo o juiz. Para isso a lei faculta alegar suspeição ou impedimento, que o advogado jamais usou. Aliás, por melhor que seja o advogado de Lula, ele é o sócio minoritário do escritório de Roberto Teixeira, compadre, advogado e benfeitor-beneficiário de Lula.

A defesa de Lula merecia um medalhão da advocacia, afinal, do outro lado estava um deles, René Dotti. Faltou dinheiro ou os medalhões perderam a confiabilidade para o PT? O partido sequer buscou seus craques, José Eduardo Cardozo e Luis Eduardo Greenhalgh, para patrocinar a causa de Lula. A presidente do PT veio com aquela de que o juiz relator era “militante” e de que o “resultado” pela unanimidade “foi combinado” entre os desembargadores do TRF.

A senadora presidente já demonstrou que é trêfega e destemperada. Oito anos de diretora de Itaipu, quatro de ministra de Dilma, mais quatro no Senado não lhe acrescentaram noção das coisas, discernimento. Lembro do episódico sintomático de, ministra de Dilma, ter comparecido ao Senado para prestar informações e por-se a dar lições de moral no senador Aloysio Nunes Ferreira, líder tucano. Recebeu uma descompostura olímpica: “a senhora pode ser senadora, mas está afastada, tem aqui seu suplente; pode ser ministra, mas vem de outro poder, que não é maior nem menor que o Legislativo; portanto, componha-se”. E ela se compôs, rabinho entre as pernas.

Ao voltar ao Senado, findo o primeiro mandato de Dilma, retomou a histeria que hoje beira o paroxismo. Tinha direito, espelhava-se num companheiro de bancada. O PT deve estar em processo de desmanche ou em falta de líderes para entregar a presidência. A senadora do Paraná fez bem ao aceitar ser presidente: ali está sua última chance de sobrevivência política. Tanto que em Porto Alegre se fez de Santa Verônica, envergando a camiseta cor de sangue com a efígie de Lula.

Isso de dizer que o TRF combinou o resultado do julgamento não é apenas um crime. É coisa pior, como disse o velho Talleyrand quando Napoleão mandou matar o duque de Enghien: é um erro. Se o julgamento é colegiado, o resultado unânime, como aconteceu, é uma das possibilidades. A outra seria o julgamento por maioria, pró ou contra. A senadora diria o mesmo caso o julgamento unânime fosse pela absolvição de Lula?

A presidente do PT, lamentavelmente senadora pelo Paraná, é formada em Direito, advogada de carteirinha. Não quero ser injusto com a escola em que se formou, mas seus professores neste momento devem estar, os que a aprovaram, envergonhados, e os que lhe deram notas baixas, seguramente dizendo “nós avisamos”.

Será que a senadora passou um dia por uma banca de segunda época, aquelas com dois ou três examinadores? Aprovada por unanimidade, foi caso de justiça, ela diria. Reprovada por unanimidade, foi resultado combinado – com certeza ali iniciou sua jurisprudência da estupidez. Que falta faz a norma do silêncio obsequioso nessas horas.

A montanha petista pariu um rato. Agito em Porto Alegre, bloqueios na Bahia, vias com policiamento aqui mesmo, em Curitiba, em frente ao foro do juiz Moro e na praça Santos Andrade. O dólar, que havia subido ontem, baixou hoje. O deus Mercado é mais forte que São Lula e a Imaculada Gleisi Hoffmann. Amanhã será outro dia, infelizmente com a malta de Michel Temer – que, nunca devemos esquecer, foi inventada, alimentada e recebeu aliança preferencial e bençãos de Lula (Dilma, reconheça-se em seu benefício, nunca engoliu Michel Temer).

Caberia ao PT neste momento lamber as feridas, fazer ato de contrição, expulsar seus vendilhões do templo e abrir uma nova era. Melhor voltar ao que foi antes do poder, a consciência crítica da nação. Será que vai fazer isso? Muito difícil. Lula vive o ranço da ingratidão, Gleisi vive o terror da abstinência, Dilma, a sobrevivente, vive o drama da rejeição. Pior que tudo, a burocracia do partido lamenta a perda das benesses e, a militância, pobre militância, mata e morre pelo falso ídolo.

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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