Ensinamentos que jamais

Tentei chegar à iluminação, mas faltou luz na rua. Fiquei debaixo do poste esperando a enchente passar.  Enquanto isso, abri o Livro das Glosas Internacionais. Minha sorte estava lançada — às moscas!  Então, nada melhor do que tirar alguns preceitos motivacionais para usar como bote salva-vidas, enquanto a Defesa Civil atacava pontos de alagamento. Deixei de lado os últimos desacontecimentos políticos, esportivos e econômicos. Me ative apenas aos aspectos peculiares da criação de galinhas carijós com mantra e incenso. Foi com alívio que extraí ensinamentos pra toda a vida de um protozoário ciliado. Vou usar e recomendo.

  1. Nunca lavar a cabeça com xampu no dia que faltar água.
  2. Não tentar cobrir uma rã-pimenta com edredom sem explícito consentimento dela.
  3. Não comer nada com estômago vazio.
  4. Jamais gesticular em voz alta com as mã abanando.
  5. Nunca trocar de roupa na frente de um ursinho de pelúcia.
  6. Não falar sozinho quando desligar o celular.
  7. Não comer peixe cru enquanto ele estiver dentro da água, mesmo que ele insista.
  8. Não tentar se aproximar de um elefante quando ele estiver rezando com a tromba voltada pro sol nascente.
  9. Jamais chamar o porteiro do edifício se ocaso for de uma cabeça de alface trancada no banheiro e chorando.
  10. Não piscar durante uma semana cheia de conflitos no ambiente de trabalho.
  11. Não atravessar a rua se o semáforo estiver com alguma cor suspeita e de óculos escuros.
  12. Nunca dizer pra um cego qual é seu signo no momento em que ele espirrar.
  13. Jamais ler um livro se o autor tiver morrido de uma doença rara que nem sequer foi autorizada pelo Ministério da Saúde.
  14. Não deixar passar nem um minuto a dívida, caso o relógio esteja devendo uma hora pra você.

Não passe adiante, sob pena de multa. Os retardatários serão chicoteados e amarrados com cadarços de alto-coturno. E vice-versa.

*Rui Werneck de Capistrano é autor de Nem bobo nem nada, romancélere, 150 páginas, 2009

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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