Tempo hostil para idosos

Tudo leva os mais velhos a se sentirem desesperadamente incapazes

Segundo li, celebrou-se ontem o Dia Internacional do Idoso. Ótimo –porque todos os outros são o Dia de Tapear o Idoso. Ou de fazê-lo sentir-se deslocado, um estranho no que ele costumava identificar como ninho –seu espaço, seu tempo, seu próprio eu.

Há pouco, observei numa agência de banco um gerente, atrás de sua mesa e de sua onipotência, impaciente diante de um cidadão de idade que lhe pedia instruções sobre como trocar uma senha ou algo do gênero. Parece que a antiga agência deste fora fechada e a sua conta, transferida. O gerente, já irritado, insistia em que o velho poderia fazer aquilo sozinho no caixa eletrônico. Intrometi-me. Disse ao gerente que a única razão de ele continuar no emprego eram os idosos que ainda iam pessoalmente ao banco –mas que se preparasse porque, com a ausência destes, ele próprio seria substituído por uma máquina.

Outra cena, neste fim de semana, foi a de um senhorzinho levado pela filha a uma operadora para “atualizar” seu celular. Pelo que observei, ele tentava entender o que lhe diziam e, como não conseguisse, parecia sentir-se desesperadamente velho e incapaz. Não lhe ocorria que, aposentado e ocioso, podia muito bem viver sem aquele aparelho.

E não há aposentado recente que não seja bombardeado por telefone com ofertas de empréstimos consignados e, sucumbindo a elas pelo cansaço, veja-se titular de dívidas que nunca pensou em contrair. Não há também velhinhas indefesas que não sejam induzidas a assinar revistas de que não precisam e, ao tentar se livrar dessas revistas, acabem assinando outras.

Quanto a mim, desenvolvi uma técnica para me livrar dos assédios. Quando uma operadora me liga toda feliz para informar que fui “selecionado” para receber tal ou qual “benefício”, interrompo para dizer que prometi à mamãe nunca aceitar favores de estranhos e mando um passar bem e tchau.

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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