Terror e inépcia

Enquanto, em Paris, o tiroteio terrorista no Bataclan se confundia com o som produzido por uma banda de rock –difícil distinguir uma coisa da outra–, no Brasil os 62 bilhões de metros cúbicos de rejeitos químicos sob responsabilidade de uma mineradora prosseguiam na sua trajetória de destruição por 500 quilômetros de Minas Gerais e Espírito Santo. Pela situação até agora, os efeitos da tragédia francesa se farão sentir por muitos anos. Os da brasileira, talvez para sempre.

Lá fora, o controle e a paranoia azedarão as relações humanas. A cordialidade dará lugar à desconfiança. Ter olhos e cabelos pretos, com ou sem barba, bastará para produzir um suspeito. Homens de bem levarão geral à luz do dia no meio da rua. A xenofobia, já latente, recrudescerá. Países outrora adoráveis poderão se tornar Estados policiais. Se esses forem os objetivos do terror, já estão sendo alcançados.

Aqui, o descaso, a fiscalização ridícula e as verbas “contingenciadas” geraram a morte de um curso d’água do porte do rio Doce e a quebra de uma cadeia de fauna, flora e recursos hídricos. Milhões de brasileiros serão afetados. Se a lama tóxica chegar ao mar, tomará santuários ecológicos, como Abrolhos, na Bahia; se outras barragens se romperem, como se teme, destruirão as cidades históricas mineiras. É possível pagar por isto?

O presidente francês François Hollande devia estar cochilando ao ignorar as advertências que lhe fizeram sobre possíveis atentados. Mas, assim que eles aconteceram, acordou e assumiu o comando. Já Dilma levou sete dias para despertar da letargia e sobrevoar a região desgraçada. Ninguém a aconselhou a dar uma rápida, mesmo que burocrática, satisfação ao país.

Na Europa, cedo ou tarde, o terror será derrotado. Mas, no Brasil, a inépcia parece invencível.

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Ruy Castro – Folha de São Paulo

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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