Todos extintos – ou quase

Ruy Castro – Folha de São Paulo

H.L. Mencken (1880-1956), o jornalista americano cuja pena perturbava os poderosos, escreveu em 1922: “Onde fica o cemitério dos deuses mortos? Algum enlutado ainda regará as flores de seus túmulos?”. E escalou um escrete de divindades que, em seu tempo, significavam a morte para quem os desafiasse: Júpiter, Ísis, Baal, Amon-Rá, Thor, Saturno, Cronos, Belus, Vênus, Odim, Marte, Plutão, Huitzilopochtli, Tezcatlipoca e dezenas de outros. “Todos foram deuses da mais alta dignidade —deuses de povos civilizados”, escreveu Mencken. “Todos eram onipotentes, oniscientes e imortais. E todos estão mortos”.

O equivalente moderno de tais potestades foram certas marcas que, por décadas, fizeram parte de nossas vidas —de certa maneira, comandaram-nas— e nos habituamos a ver como eternas: Esso, Gulf, Texaco, Cadillac, Buick, Pontiac, RCA Victor, Pyrex, Catalina, Ray-Ban, Constellation, PanAm, Rinso, Kolynos, Gessy Lever, Gumex, Brylcreem e, até há pouco, Kodak, Xerox, Blockbuster. Não é necessário explicar a que produtos se referiam. Todas soam familiares. E todas se evaporaram de nossas vistas e vidas.

Assim como, no terreno nacional, o Mappin, a Mesbla, a Sears, o Fusca, o FNM (Fê-Nê-Mê), a Panair, a Varig, a Vasp, o “Correio da Manhã”, a TV Tupi, o Liberty Ovais, o Crush, o Grapette e, mais recentemente, o Bamerindus, o Unibanco, o Banco Real —e, se até os bancos brasileiros morrem ou se fundem, imagine as outras empresas.

Pois assim foi e será também com os partidos políticos. No passado, tivemos o solerte PSD (Partido Social-Democrata), de JK e Tancredo. Depois, a lúgubre Arena (Aliança Renovadora Nacional), que, um dia, julgou-se “o maior partido do Ocidente”. E, hoje, o PT e o PSDB, agarrados à ilusão de que ainda têm eleitores.

Todos extintos —ou quase.

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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