Um sonho

Nos tornávamos enfim
o país que há poucos anos acreditávamos que seríamos

Esta noite eu tive um sonho bem louco. Na verdade, começou como um pesadelo. O Brasil ia eleger um presidente fascista que falava em torturar e matar oponentes, em acabar com todos os ativismos, em vender as reservas indígenas, em militarizar as escolas, em submeter o Ministério do Meio Ambiente ao da Agricultura, em proibir a palavra “gênero” dentro das salas de aula e outras bizarrices que não faziam sentido e eu não lembro direito.

Eu tentava avisar as pessoas “Olha o que ele tá falando! Olha que absurdo!”, mas ninguém ouvia, quer dizer, as pessoas ouviam, mas diziam que iriam votar no candidato fascista porque qualquer coisa era melhor que o PT.

Eu insistia “Gente, o PT fez besteiras, mas o Haddad não é a Dilma e mesmo o pior Armagedom dilmístico é melhor do que o que esse cara prega!”. Aí as pessoas diziam que o que o candidato fascista falava não era verdade, ele só estava brincando de fingir que era fascista a vida inteira, mas quando fosse eleito ele iria parar com a brincadeira.

Aí seguidores dele abatiam um cachorro a tiros e matavam um cara a facadas e espancavam pessoas —ao todo, no meu pesadelo, eram 50 casos de violência perpetrados pelos soldados daquele que não estava falando sério— e eu gritava “Olha isso! Olha isso!” e as pessoas respondiam: “PT nunca mais!”.

Nesse ponto o pesadelo deixou de ser pesadelo e virou um sonho. Ó que doideira: eu estava na plateia do Domingão do Faustão e no palco o Fernando Henrique aparecia junto com o Alckmin e o Ciro Gomes e a Marina Silva e o Amoêdo e quando eu via estavam ali também o Caetano e o Gil e o Henrique Meirelles e a Kátia Abreu e vários empresários liderados pelo Ricardo Semler mais o Casagrande e o Luciano Huck e o RenovaBR e o Acredito e a Ivete e a Sandy, era tipo o “We Are the World” da democracia, uma frente ampla de pessoas que discordavam em diversos pontos sobre política, economia, costumes, mas acreditavam no Estado de Direito, nos ideais herdados do iluminismo, que pregam que todos são iguais perante a lei e cada um pode ser o que é.

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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