Aqui fala um Anônimo Venusiano, com a veneziana aberta pra receber o frio outonalmente infernal. Num átimo, Erich Fromm, from the past, pousa suavemente na mesa e traz A Arte de Amar, que ninguém nunca aprende, nem sequer estuda. Uma vida é muito pouco pra matéria tão vasta e misteriosa. Passamos de ano por obra e graça da professora D. Vida. Ela fecha os olhos, compreensiva, pra nossa burrice, falta de empenho e despreparo. E faz a média ponderada de encontros e desencontros (fortuitos ou sérios), além da muita água da indiferença passando por baixo da ponte dos desejos, pra nos dar uma nota que mal chega pra passar de ano. Respiramos aliviados e tocamos pra frente. Amor: verbo em trânsito. Impedido. Preferimos estudar qualquer coisa que não encha muito a cabeça. Que deixe em paz o coração.
Abro mais a janela e vejo o pássaro Paracelso num galho da árvore mais próxima. Ele recebe o solzinho nas asas, estofa o peito e se põe a cantar:
“Quem nada conhece, nada ama. Quem nada pode fazer, nada compreende. Quem nada compreende, nada vale. Mas quem compreende também ama, observa, vê… Quanto mais conhecimento inerente houver numa coisa, tanto maior o amor… Aquele que imagina que todos os frutos amadurecem ao mesmo tempo, como as cerejas, nada sabe a respeito das uvas.”
E voa até o chão pra bicar uma laranja madura que estava dando sopa. Fiquei um tempo ainda ressoando a última frase da canção: “Aquele que imagina que todos os frutos amadurecem ao mesmo tempo, como as cerejas, nada sabe a respeito das uvas.” Uvas, uvas suvas suvas uvas… a frase ficou reboando igual um sampleado tecno. E foi se perdendo no andar ligeiro dos ponteiros do relógio. Apressei a barba e o banho. Vesti meu sorriso mais bem passado e saí. A rua que me leve. Maduro e verde, verde e maduro. Como o sinal do trânsito na primeira esquina regulando a vazão do trêfego tráfego matinal.