Leio em “O Globo” que dois ex-secretários da Defesa dos EUA, Leon Panetta e Robert M. Gates, e a ex-secretária de Estado Hillary Clinton acabam de publicar livros analisando suas relações com o presidente Barack Obama enquanto trabalharam para ele. Os secretários americanos correspondem, claro, aos nossos ministros. Mas a comparação termina aí.
Numa rara convergência de avaliações, os três concordam em que Obama é “inteligente e bem intencionado”, mas sua política para Iraque, Síria e Afeganistão é equivocada. Obama não ouve os especialistas, dizem. Confia demais em seus áulicos da Casa Branca; é inábil ao lidar com os governantes daqueles países e, mais grave, subordina suas decisões em política internacional aos interesses mesquinhos da política interna dos EUA. Ou seja –a imagem é minha–, joga para a galera usando povos inteiros como malabares.
Não sei se os ex-secretários têm razão ou não. O que me fascina é que, uma vez fora do governo, ex-servidores americanos se dispõem a discutir esse mesmo governo e fazem acusações sérias ao presidente. E este, longe de ficar “estarrecido”, aceita a crítica e apenas abstém-se de comentar, o que está no seu direito.
Exceto Hillary, que inala e exala política e quer suceder Obama no emprego, imagino que os outros dois ex-secretários tenham sido indicações técnicas. Estavam lá porque entendiam do riscado. Nos EUA, os ministérios não costumam ser moeda de troca governamental para comprar apoios. Seus ocupantes já são do partido do presidente, o que não os impede de discordar deste em voz alta e até publicar livros a respeito.
No Brasil, o único objetivo de certos ministros é sobreviver no cargo ou a uma eventual dança das cadeiras. Seu compromisso não é com o país, mas com o miserável partido a que pertencem.
Ruy Castro (Folha de São Paulo)