Para conhecimento geral da Nação

A recente descoberta dos textos OSS, na antiga capital do Paraná, uma cidade que se chamava Ka-Ra-I-Tu-Ba (ou Ko-Reu-Dupa, conforme outra tentativa de leitura possível) começa a provocar verdadeira revolução na idéia que se fazia do aborígene que habitava as bordas da Boca Maldita, rico sítio arqueológico onde foram encontrados os restos do “Homo Adherbalensis” e uma mandíbula do “Homo Mazzensis”, índices seguros de que havia vida inteligente no lugar, quando os textos foram escritos.

O crânio de um Dalton Trevisanosaurus Rex, um antepassado do vampiro da Transilvânia, com seu caninos afiados, prova que boa parte da fauna local se alimentava do sangue dos próprios companheiros de flora e habitat. A imensa quantidade de garrafas de Velho Barreiro e de cerveja é uma evidência dos hábitos etílicos da população desse vale, que se revelou tão rico em tesouros arqueológicos.

Basta dizer que foram encontrados vestígios do esqueleto de um Solda, a vértebra de um Manoel Carlos Karam intacta, a asa inteira de um Rogério Dias e até o omoplata de um Roberto Requião, facilmente reconhecível pela sigla PMDB, gravada na face anterior.

Nenhum Leminski foi ainda encontrado nas imediações da Boca, mas isso se deve ao fato de que esses animais ariscos preferiam as cruzes do pilarzinho para desovar seus ovos e cometer seus desatinos. Esses animais viviam às custas dos bandos de dantes mendonças e setos que sobrevoavam os pântanos da Boca em busca de tipos para caricaturar. As primeiras tentativas de decifrar os textos OSS, hoje classificados em dois grupos, o Grupo OSS-Nossos e o Grupo OSS-Deles, começam a produzir resultados. O primeiro texto a ser traduzido nos revela um mundo cheio de esperança e alegria, onde as ternas alegrias do lar se mesclam, delicadamente, a alguma porradas de karatê na boca. Ele diz, mais ou menos assim, traduzo livremente:

meus amigos bebem demais
meus amigos fumam demais
meus amigos falam demais
meus amigos morrem demais
eu chego sozinho aos quarenta


A julgar por este fragmento dos textos OSS os contemporâneos tinham muitos amigos. Sem dúvida, a amizade era um dos sentimentos mais cultivados entre os OSS. O tom melancólico da conclusão insinua que os OSS não chegavam facilmente aos 40 anos, coisa que se devia certamente às condições insalubres da vida que levavam, a seus hábitos noturnos e aos vícios que praticavam. O que mais espanta os tradutores dos textos OSS é a violência de inúmeras passagens, o que insinua que não era fácil a sobrevivência desse povo, em eterna luta contra instituições injustas. Basta atentar para passagens como:

vou te preparar uma emboscada
se sobrar um osso, dou
pra cachorrada…

Ou:

é duro perder um dedo
mesmo tendo esta mão
cheia de dedos

Nada nos autoriza a imaginar que os OSS tivessem mais de cinco dedos. “Cheia de dedos”, aqui, quer dizer apenas “uma mão inteira”. Por esse lado, podemos fazer um paralelo entre os OSS e a tribo “punk” que nessa época invadiu as butiques, danceterias e as lanconetes da Boca, e proclamou o império da porrada, do Relógio das Flores até o Pasquale, ao lado da Ilha dos Macacos. Alguns pesquisadores suspeitam, po isso, que os OSS tinham relações íntimas com os primatas que praticavam “Rock and roll”, um ritual sangrento que exigia que um Jimi Hendrix morresse de “overdose” de heroína de seis em seis anos, para aplacar a fome de lucros das Warnes Brothers, uma divindade da época que soltava elepês e compactos pelas narinas. Segundo opinião unânime, o mais comovente dos textos OSS é um hino à um cometa chamado “Desta vez vai bater”, um poema que começava dizendo:

em todos os textos antigos
desde os tempos mais remotos,
para terminar melancólico.
quer correr mas agora é tarde
quer gritar mas agora é longe.

Não, senhores. Não era fácil a vida do povo que escreveu os textos OSS. O pessimismo que permeia os textos OSS fornece um testemunho eloqüente da dificuldade de se relacionar com as ilusões da época, o desespero transformado em sarcasmo e ironia, a agressividade dos agredidos, a ira estéril daqueles que já não acreditam mais em nenhuma utopia. Nas areias movediças da angústia, os OSS não economizavam palavrões nem insultos, nem maldições aos deuses do céu e da terra.

Amanhã, de manhã, na livraria Dario Velloso, na feira “hippie”, na Praça do Relógio das Flores, vão estar à venda alguns poemas OSS, num volume chamado exatamente “OSS”. Quem quiser ir, vai. Quem não quiser vai plantar batatas, pois como diz um texto OSS:

ninguém vai querer saber
se você presta ou não presta
a grande maioria te odeia
o resto te detesta

Paulo Leminski (Não encontrei a data nos meus arquivos. (Thadeu, pega essa bola!)

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
Esta entrada foi publicada em Sem categoria. Adicione o link permanente aos seus favoritos.
Compartilhe Facebook Twitter

Deixe um comentário

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.