Por amor o massacre promovido pelo soldado americano, também em nova semana de gripe suína e da carteira de motorista com 130 pontos negativos? Cinco colegas de combate mortos e três feridos em Bagdá… Dois jovens mortos em Curitiba… Sim, caros animais meus semelhantes, o amor ao ódio também é uma forma de amor. Sinistra, mas, pasmem!, na visão da expert Fisher, também amor.
É essa visada singular, lúcida posto que alcança enxergar o avesso do avesso do avesso (que ainda é, por suposto, o avesso…) o que chama atenção nos inúmeros estudos e ensaios de Helen Fisher sobre o amor. Claro, há o amor ao Amor, sublimidade de um santo espírito que faz um Einstein, um Santos-Dumont ou uma madre Tereza de Calcutá. Mas, em contrapartida, o nefasto amor, por exemplo, de Adolf Hitler aos preceitos (preceitos?) do Nacional-Socialismo…
Ms. Fisher
estudou 62 culturas para escrever o seu A anatomia do amor. Particularmente intrigante, senão assustador, o que dedica à paixão, no geral uma sinistrose que costuma acometer pessoas de todos os sexos, dos 13 aos 100 anos. Segundo a antropóloga, estudiosos da neurociência já comprovaram em laboratório que vastas áreas cerebrais são tomadas pela “dopamina” nos apaixonados.A dopamina é um neurotransmissor responsável por estimular o sistema nervoso central. Do guerreiro índio prestes a disparar sua flecha, ao motorista enlouquecido no trânsito, estão ambos “dopados”… Desnecessário acrescentar a origem do verbo.
Somos mesmo uns animais complexos e se foi pelo amor de Deus que surgimos cá neste insensato mundo, é cousa bem mais teosófica do que científica. Acredite quem quiser. Deu-nos, o Criador, segundo o cânone religioso, o livro arbítrio. E se fizemos, com a liberdade de amar, os poemas suntuosos e as obras eternas no bronze ou no mármore, não nos esqueçamos da lição de Helen Fisher – também criamos com ela o que mora no avesso do sentimento alguma vez odioso.
Feito dizia Drummond num soneto não por acaso chamado “Destruição”: “Os amantes se amam cruelmente/ e com se amarem tanto não se vêem/ Um se beija no outro refletido/ Dois amantes que são? Dois inimigos”.
Helen Fisher e o alucinado soldado americano que o digam. Ah, e também a dopamina.
Wilson Bueno (17/5/2009) O Estado do Paraná.
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