Outro dia me dei conta de que estava sem critério. Nem lembro pra quê precisava, mas não tinha. Depois de revistar minuciosamente a mim mesmo, procurei pela casa inteira. Nada de critério. Claro, na falta dele, a busca é feita de forma não criteriosa.
O jeito foi sair para me abastecer, lá fora eu acharia. Afinal, critério é o alicerce da civilização. Ou é o telhado da sociedade? Talvez o corrimão da vida. Vê como não ter critério afeta a visão das coisas?
O mais prático é o comércio, que tem critério de moda, de utilidade, de funcionalidade. Entrei numa lojinha de R$1,99 e logo constatei: se não têm qualidade, vão ter algum critério? Percorri algumas vitrines e desanimei: não há critério à vista.
Na banca da esquina, folheei jornais e revistas. Triste. Pelas manchetes e textos, percebe-se que a maioria dos veículos já não tem nenhum critério. Por tabela, descartei a internet.
Quem sabe orientação profissional? Com médicos e advogados tive que considerar uma segunda, terceira, até quarta opinião, todas desprovidas do critério que eu queria.
Depois de me desiludir com artistas e intelectuais, que há muito também necessitam de critérios, arrisquei encanadores, eletricistas, pintores, e eles dizem que a ferramenta não funciona. Até cogitei de consultar políticos mas desisti – a última campanha eleitoral mostrou preocupante ausência de critérios.
Restava recorrer à sabedoria de pensadores e filósofos, educadores e até de formadores de opinião. Prestei atenção nos talks-shows onde se prestam à participação e acabei por concluir o inesperado: que eu sem critério me guio melhor que eles com o deles.
Ainda havia muito que cavocar atrás de critério, o dia findava, a necessidade aumentara. Porém, sem ele, não se tem a noção certa de onde ir, do que fazer, qual interjeição usar. Diacho!
Como o prazo para entregar o texto se esgotara, ele ficou assim mesmo, descriteriado. Ou descriterizado? Se o leitor julgar este conteúdo criteriosamente, bom sinal. Algum critério ainda resta no mundo.