Alegoria religiosa

Foto sem crédito.

Eu sempre me imaginei fazendo uma reportagem sobre a deusa viva do Nepal, uma das histórias mais impressionantes que eu tinha ouvido. Era, no mínimo, uma boa pauta. E quem a contava, até de forma espetaculosa, era o engenheiro Rafael Grecca de Macedo, que estivera recentemente na Ásia e visitara, no Himalaia nepalês, o castelo onde vive (se instala) a família da menina que encarna o mimo sagrado denominado A Deusa Viva do Nepal, ou, kumari, a reencarnação de Durga.

Elas são escolhidas tradicionalmente por um sacerdote ligado à monarquia do Nepal e costumam ter entre 6 e 7 anos. Como manda a tradição secular, deixarão de ser deusas quando menstruar pela primeira vez. Ou sangrar de outra maneira, através de ferimentos casuais domésticos ou similares. Por esta razão a menina-deusa vive constantemente cercada de devotos e serviçais que a protegem e adulam durante os intermináveis dias do seu reinado. Vive deitada em almofadas de seda e não pode brincar e nem correr, pois qualquer acidente poderá afastá-la prematuramente da condição de divindade – pois a única a forma natural de perdê-la é menstruando. Assim, depois dela, outra kumari será escolhida. Enquanto isso, a família – quase sempre de origem pobre – se locupleta morando no castelo com todas as mordomias. Simples e volátil como um conto de fadas.

Qual novidade? É que este ano a escolha da kumari aconteceu de forma agressiva, rompendo com a tradição. Pela primeira vez a deusa foi indicada pelo governo maoísta, de ideologia atéia, consolidando o fim do governo de Gyanendra, destronado em maio deste ano.
É o fim da tradição. Talvez seja isso que alguns chamam de fim do mundo.

Toninho Vaz, de Santa Teresa.

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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