Laurence Olivier, Hamlet – © Getty Images
João Maria tenta desesperadamente escrever uma peça de teatro para participar de um concurso. Folheia livros, consulta anotações. A campainha toca, ele vai atender. É Fausto, acompanhado do Diabo. João Maria esperava Godot, mas não diz nada. Fausto, que firmara um pacto com o Diabo, quer que João Maria o ajude a procurar Margarida, expressão de pureza e virtude. João Maria se recusa. Tem que lavar toda a louça e levar as crianças no colégio. Mefistófeles, escondido atrás da cortina, ouve toda a conversa. Misteriosamente, o telefone toca. É Goethe. Começa o bate-boca. A mulher de João Maria reclama do barulho. João Maria vende a alma a Goethe, que lhe promete a juventude eterna, a satisfação dos desejos e dois ingressos para o show da Rita Lee. A empregada, encarnando o conflito humano entre a matéria e o espírito, ignorando a situação, pede aumento. Surge Godot, não se sabe de onde, representando as obras de cunho universal. Alguém tenta servir o cafezinho. As luzes se apagam. Mefistófeles passa a mão na empregada. Tumulto. O inspetor Poirot invade o apartamento. Fica no ar aquele cheiro de carta rasgada.
Bentinho e Capitu estão almoçando. Em outra mesa do restaurante, Tom Jones, o andarilho generoso e irreverente, interrompe o licor e observa a salada dos Irmãos Karamazov. É sábado. Um baiano reclama da feijoada.
Um rei é assassinado. No velório, os presentes refletem sobre as paixões humanas, a harmonia social e a moral da sociedade. Três feiticeiras horrendas mandam um pombo-correio para Riobaldo, General do Exército Real, avisando que ele será o futuro soberano do Nordeste.Sem saber de nada, Riobaldo come o pombo. Chove em todo o sertão. Riobaldo, com disenteria, mata o Rei Duncan, tornando o clima sombrio. Intriga. Medo. Violência. Todos vão ao McDonald’s mais próximo.
João é noivo de Maria. Trocam carícias no velho sofá desbotado. O retrato do pai os observa. Dona Rosinha prepara o jantar. Dalton Trevisan passa pela sala na ponta dos pés, tropeça num lugar comum e cai nos braços do vampiro de Curitiba. Mistério. Tchekov e Maupassant zombam dos leitores. Trevisan, observador atento dos pormenores da realidade, se afoga. Um moço em Curitiba só tem um remédio: afogar-se. Pára a música, fecham-se as cortinas e ninguém mais toca no assunto.
O Grande Vazio da Alma Humana está na sala vendo televisão. A Fantasia Exótica Magistral volta da feira e encontra os Traços Primitivos fazendo algazarra no banheiro. O Grande Vazio pergunta pelo salsão. Não havia salsão na feira. A Fantasia Exótica chama todo mundo e faz uma descrição do mundo tal como ele realmente é. Tolstoi, apavorado, foge de casa. O Compêndio de Gramática explica que o artigo é a parte da palavra que serve para exprimir a extensão em que o substantivo será tomado. Pânico no palco. A omissão do Artigo Definido acaba incriminando a Formulação do Plural, que foge do país. O Grande Vazio da Alma Humana continua vendo televisão.