“Certo. Eu tava falando que o Rei parecia, em muitos momentos, um homem que ia entrando de novo e sem cerimônia no nosso mundo daqui da comunidade. O homem tava invadido por uma transformação. E tudo mundo naquela festa podia sentir isso. Então foi que as nossas esperanças cresceram. As pessoas abraçavam o homem. Umas tiazinhas beijavam ele e pediam pra ele posar pra fotinha. Ele parecia um desses cantores famosos que vende uma porrada de CD. Desses cantores que levantam a mulherada da cadeira nos programas de auditório que a gente assiste todo domingão, que felicidade de pobre é ver esses apresentado¬res fodões tipo o Santos, o Liberato, o Silva. É, tudo esses caras aí que disputam a nossa audiência, pois é a gente que sustenta eles no sucesso da telinha por anos. E eles sabem disso. A gente tamém sabe. Tudo mundo sabe. Mas um não pode viver sem o outro. Entende? A gente sem eles, eles sem a gente. Daí que eu acho que naquele momento lá o Rei percebeu isso muito bem. Que ele também não podia chegar no poder da cidade sem se aliar ao seu povo mais fiel. Seus súditos. Não é essa a palavra, súdito, que a gente usa pra falar do povo que aclama e vive pra louvar, seguir e obedecer um Rei? Então… Fiquei na fé que ele manjou isso.”
PAULO SANDRINI [Vera Cruz, SP] vive em Curitiba. É autor dos livros O estranho hábito de dormir em pé [2003], Códice d’incríveis objetos & Histórias de lebensraum [2005] e Osculum obscenum [2008]. Participou de coletâneas no Brasil [entre elas Geração Zero Zero, fricções em rede e Contos cruéis: as narrativas mais violentas da literatura brasileira contemporânea], Argentina e Peru.
Kafka Edições. 2011. Coleção Livros que não param em pé. Com que se pode jogar| Luci Collin, O Rei era assim| Paulo Sandrini e Os hábitos e os monges|Assionara Souza. 80 páginas|Projeto gráfico e foto capa: Paulo Sandrini| Revisão: Assionara Souza & João Paulo Partala|Coordenação Editorial: Paulo Sandrini e Luci Collin|Produção Cultural: Pier Arte & Cultura| Impressão Serzegraf Ind. Edit. Gráfica Ltda, Curitiba.