Num ótimo ensaio na revista “Serrote” (http://bit.ly/NLRZYc), o escritor Daniel Galera examina a experiência dos videogames e procura apontar o que ela tem de diferente, de novo e de útil para nós. Essa discussão é parecida com a de quase um século atrás sobre “o específico fílmico”. O específico fílmico era, segundo os teóricos, um modo de experimentar o mundo através do cinema que não podia ser proporcionado pela literatura, pelo teatro, por nenhuma outra arte.  Claro que cada teórico via esse “específico” de uma maneira diferente.  Para Rudolf Arnheim, por exemplo, eram as limitações da imagem cinematográfica que produziam sua linguagem nova, única: o fato de ser limitada por um retângulo, de ver as coisas por um só ângulo de cada vez, etc.

Galera indica uma diferença essencial nos games, o que ele chama de “narrativa procedimental”, o fato de que cada jogo precisa ser jogado de maneira ligeiramente diferente, e que é somente jogando que o jogador aprende o modo de jogar o jogo e o objetivo do jogo.  Isso está na raiz da interatividade do jogo, do fato de que ele exige ações e decisões do jogador, coisa que o espectador cinematográfico não precisa executar. No cinema, existe apenas a ação intelectual de interpretar as imagens, mas o espectador não toma decisões sobre o que vai aparecer na tela em seguida. Nesse sentido, o “específico fílmico” requer a observação, e o “específico guêimico” (desculpa aí!) exige a interatividade.

Diz Galera: “A maioria dos ‘gamers’ nem se dá conta de que a narrativa procedimental é o que realmente os absorve e fascina enquanto dedicam horas a seus jogos favoritos. Isso não quer dizer que os personagens e o enredo sejam desprezíveis – ao contrário, são essenciais para disfarçar o fato de que estamos interpretando e executando um algoritmo. O enredo entra para nos fornecer tudo o que o algoritmo não pode: uma motivação, um início e um fim coerentes, um dilema moral, uma chave para associar a narrativa procedimental a um universo fantasioso ou a um episódio específico do mundo real. Mas o que jogamos é o jogo. O que nos move, em última instância, é o prazer proporcionado pela interpretação desse conjunto específico de regras, pela descoberta das maneiras como podemos interagir com esse mundo fictício, pelo aprendizado e pela habilidade progressivos que nos permitem, dependendo do jogo, fazer nossa parte para conduzir o programa a seu estado final, à conclusão da história, à obtenção de um desempenho distinto, ao recorde de pontos, ao esgotamento das possibili¬dades, à exploração de todo o espaço de jogo, ao uso criativo das variáveis”.

Braulio Tavares

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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