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Mãe,
Foi bonita a festa, mãe. Fiquei contente. Pena a senhora ter ficado tão doente. Alguma coisa aconteceu este ano. No desfile das escolas, o paulista cantava e pulava nas arquibancadas. Eu vi. Juro por Deus! Só estranhei a alegria na hora em que entrou a escola Vai-Vai. Todos se excederam no gritar: Vai-Vai! Vai-Vai! Vai-Vai! Será o Geisel?
E a polícia? Coisa mais impressionante. A polícia não veio de cachorro este ano e sua bateria foi desclassificada: nenhum cassetete. Ah! Vi um PM boa-pinta que se desmanchava todo com duas mocinhas que lhe jogavam bolinhas de papel. A gente, que tá acostumado a ver tiro de lá e pedrada de cá, estranha.
Não se preocupe, brinquei, folguei, safadei, mas na quarta fui purificar o corpo e alma nas cinzas. Restaram só dois pecados veniais e um original (ainda os pés. . .), que uma severa confissão resolve. Vou ficar zerado na quaresma, sossegue.
Pra senhora ver que não me alienei de todo, estou com plano de pedir um novo recenseamento. Sim, quero saber quantos somos. Os uruguaios já levaram a Flávia Schilling, seqüestraram o comerciante Asdrúbal Moreira e agora o José Veríssimo. A Argentina sumiu com o músico Tenório e nos levou o Flávio Koutzii. Isto que a gente sabe. Assim, se no censo de 70 éramos 110 milhões, agora somos 109 milhões, 999 mil e 996. Insisto: além de anistia, eleições diretas, Constituinte, precisamos ter um Exército, uma Marinha, uma Aeronáutica e até uma Lei de Segurança do Nacional.
Enquanto não aparece homem na casa, acho que toda noite deveríamos fazer chamada pra ver, pelos ausentes, quantos que o Uruguai levou de dia:
Laerte?
Nilson?
Maurício?
Lucinha?
Rossana?
Suely?
A bênção do seu filho presente, Henfil