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Em jantar oferecido pelo vice-presidente Michel Temer na noite desta terça-feira, a fina flor do PMDB decidiu tomar distância das providências impopulares que Dilma Rousseff terá de adotar para estancar o déficit nas contas da União. O partido irá cobrar da presidente que assuma suas responsabilidades, cortando despesas. De resto, a legenda concluiu que não lhe cabe sugerir a criação ou elevação de tributos. Deixará claro para o Planalto que não há boa vontade do Congresso para salgar a carga tributária.
Estiveram no Palácio do Jaburu, residência oficial de Temer, seis dos sete governadores do PMDB: Luiz Fernando Pezão (RJ), José Ivo Sartori (RS), Paulo Hartung (ES), Renan Filho (AL), Marcelo Miranda (TO) e Confúcio Moura (RO). Foram à mesa também os presidentes da Câmara e do Senado, Eduardo Cunha e Renan Calheiros; os líderes da legenda nas duas Casas, deputado Leonardo Picciani (RJ) e senador Eunício Oliveira (CE); o senador Romero Jucá (RR); e três ministros peemedebistas: Kátia Abreu (Agricultura), Elizeu Padilha (Aviação Civil) e Helder Barbalho (Pesca).
Com a crise roendo-lhes as receitas, os governadores peemedebistas chegaram ao jantar de pires na mão. A maioria revelou-se disposta a defender a criação de fontes de receita que pudessem ser divididas com os Estados. Mencionaram-se a ressurreição da CPMF e a elevação da Cide (contribuição sobre combustíveis). Renan Calheiros e, sobretudo, Eduardo Cunha torpedearam a ideia de o PMDB assumir o ônus de encampar propostas que retirem dinheiro do bolso dos brasileiros. Foram ecoados pelos senadores Eunício Oliveira e Romero Jucá.
Antes de recepcionar seus convidados, Michel Temer fora chamado ao gabinete de Dilma. Na saída, dissera que era preciso “evitar remédios amargos”. Mas ainda mantinha a intenção, ensaiada desde a véspera, de endossar sugestão do economista Delfim Netto de elevar a tarifa da Cide de R$ 0,10 para R$ 0,60 por litro de gasolina. Durante o jantar, porém, Temer deu meia-volta, abstendo-se de defender a providência.
Pela manhã, Temer soava convicto ao dizer que a Cide poderia ser aumentada sem ouvir o Congresso. À noite, ruminava uma dúvida: o Executivo poderia decidir por decreto apenas nas hipóteses de reduzir ou zerar a alíquota da Cide. Para aumentar, talvez dependesse, sim, da anuência do Legislativo.
Diante da hesitação de Temer, coube à ministra Kátia Abreu, hoje uma confidente de Dilma, assumir a defesa da tese. Munida de um artigo escrito por Delfim no jornal Valor e de dados que ela própria colecionou, Kátia fez uma defesa veemente do seu ponto de vista. À medida que a ministra empilhava sobre a mesa razões para elevar a Cide —desde a recuperação da indústria sucroalcooleira até o aumento das receitas da União e dos Estados—, Eduardo Cunha enfileirava motivos para evitar a medida, a começar do seu efeito inflacionário.
Os governadores saíram do jantar como entraram: de pires na mão. Nem Renan, cujo filho governa Alagoas com o caixa em ruínas, animou-se a defender mais impostos. Ficou entendido que o PMDB não imprimirá suas digitais em propostas que aumentem impostos. Prevaleceu o entendimento segundo o qual é papel de Dilma dizer o que o governo pretende fazer. Concluiu-se que não cabe ao PMDB senão cobrar do governo cortes de despesas.
A alturas tantas, o senador Eunício Oliveira insinuou que Dilma tenta compartilhar responsabilidades com os partidos e o Congresso para não se desgastar junto à opinião pública. Irônico, indagou: que desgaste o governo pode ter se já não dispõe de popularidade nenhuma? Como pode piorar alguém que já está na casa dos 7% ou 8%?
Josias de Souza|UOL