Eduardo Cunha e alguns outros citados na Lava Jato vão ter seus destinos de réus determinados também por decisões judiciais alheias aos atos de que são acusados. É que está em curso uma bela divergência, ainda silenciada, em torno do que vários juristas e professores de direito consideram um erro formal no âmbito da Lava Jato. Capaz mesmo de invalidar provas decisivas, por exemplo, no caso de Eduardo Cunha. Da Lava Jato sai uma explicação, discreta e, por ora, sem o resultado pretendido.
O problema está na maneira de obter dados e providências dos promotores suíços, referentes a possíveis contas e movimentos financeiros de interesse da Lava Jato. O acordo de colaboração entre Brasil e Suíça contra crimes financeiros obriga que todo intercâmbio tenha um único ponto de partida ou chegada aqui, e outro lá. No Brasil, tal ponto é o setor específico do Ministério da Justiça. A obrigação evita que investigações suíças se vejam assoberbadas por pedidos que não passaram por uma avaliação do seu fundamento e origem.
O primeiro sinal de contas e movimentações suspeitas, com probabilidade de servirem a negócios ilícitos sob investigação no Brasil, foi dado pelos suíços. A partir do sinal, a Lava Jato tentou a obtenção direta das informações complementares e dos documentos comprovadores, mas os suíços não saíram dos termos do acordo. Como uma providência admirável, foi divulgada aqui a ida de três integrantes da Lava Jato à Suíça, para buscar a documentação. Sobre os resultados da viagem, a prodigalidade de vazamentos da Lava Jato não se confirmou.
A iniciativa da missão passava à margem do setor específico do Ministério da Justiça e das exigências do acordo com a Suíça. A ação direta do Ministério Público, inclusive autorizada pelo procurador-geral Rodrigo Janot, é vista por vários juristas e professores ouvidos por algumas das defesas como procedimento irregular capaz de levar à invalidação de parte das acusações a diferentes réus. Da Lava Jato, vem a resposta de que seus emissários apenas foram selecionar, na relação suíça de suspeitos, os nomes a serem encaminhados ao Ministério da Justiça para o pedido à Suíça.
Mas é ao menos duvidoso que, para tal fim, a viagem fosse necessária. Mais do que não se negar à colaboração pelos canais corretos, os suíços têm mesmo a iniciativa das informações. Foi assim, além da Lava Jato, na corrupção do metrô e dos trens paulistas, até que um procurador enfurnou a documentação e os suíços se aborreceram. A base do trabalho deles é a investigação, não a delação premiada, e os suíços disseram sentir-se desconsiderados pelo descaso do Ministério Público brasileiro.
Se nem mesmo um precisaria viajar, três procuradores apenas para repassar uma lista de nomes parece um pouco exagerado. E, à parte a divergência que os magistrados vão decidir, é esquisito que até o procurador-geral Rodrigo Janot conduzisse a operação excluindo o Ministério da Justiça e os termos de um acordo internacional.
OS CHEFÕES
A pretensão de impor aos deputados do PT a obediência à direção partidária, nos votos petistas contra ou a favor de Eduardo Cunha no Conselho de Ética, é autoritária e imoral. O líder Sibá Machado, que não se distinguiu por uma posição nítida quanto ao presidente da Câmara, redime-se com sua recusa a substituir a consciência pessoal pela obediência.
O comando do PT fala em refundação do partido. Convém que o ponto de partida seja a explicação de que os petistas refundados não precisam ser pessoas de consciência, porque não poderão usá-la.
Janio de Freitas – Folha de São Paulo