Não chegarei ao cúmulo de encabeçar um movimento “Volta Dilma!”, porque correria o risco de ser interditado e internado num daqueles manicômios que nem existem mais em Curitiba. Mas está duro aceitar em silêncio as estultices do governo Temer, um governo fraco, mal constituído, amedrontado e absolutamente inseguro.
“É o que nós temos” – dirão os teóricos da objetividade. Sim, é o que nós temos e não há nada melhor no horizonte, mas – que diabo! – não poderia ser um pouquinho mais proveitoso, mais esperançoso, menos decepcionante?
O vice Michel Temer está completando um mês de reinado. Nesse breve período, já trocou dois ministros, já nomeou e desnomeou vários secretários, já desmontou e remontou ministérios e foi obrigado a engolir líderes que não queria. Prometeu cortes de despesas e extinção de milhares de cargos comissionados e não cumpriu nem uma das promessas. Aí incentivou a aprovação de um reajuste generalizado de salários de servidores federais dos três Poderes, incluindo os subsídios dos ministros do Supremo Tribunal Federal, que, como se sabe, balizam os salários públicos nacionais – coisa arranjada no governo Dilma e encampada pelo dele. Quando a Câmara dos Deputados, num tour de force sem precedentes, aprovou todos os projetos, unanimemente, sem restrições, s. exª. pediu publicamente uma salva de palmas para os nobres parlamentares.
A imprensa, no seu papel, fez o alarde. Sem entrar em detalhes e ignorando que a coisa não era bem como parecia, atiçou a opinião pública contra o governo. Sobrou para a turma da capa-preta. Michel fez vazar a notícia de que, se o Senado não tomasse uma medida, vetaria o reajuste do STF, que ele próprio encampara e festejara. Mas, como não poderia, de modo algum, ficar de mal com o pessoal da toga – logo agora que a Operação Lava-Jato se expande e atinge o arraial do PMDB, que até bem pouco tempo o vice presidia – inventou uma “gratificação” por fora para a ministrada do STJ, coisa de R$ 5 mil e pouco por mês.
Ficou pior a emenda que o soneto. Seria um novo e perigoso precedente, a somar-se ao auxílio-moradia, auxílio-transporte, auxílio-educação, auxílio-toga, auxílio-livro e outros auxílios mais, tudo em forma de verba indenizatória, isenta de impostos, de limitador salarial e sem risco de efeito cascata.
Durou pouco. Na semana passada, oito associações de classe da magistratura e do Ministério Público, como era de se esperar, puseram a boca no trombone. Em nota à imprensa (que nenhum jornal publicou*), afirmaram, eufemisticamente, não acreditar na desastrada intenção do atual governo de tirar o apoio à “recomposição parcial das perdas inflacionárias dos subsídios de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Procurador-Geral da República”.
Argumentam que “os projetos foram aprovados por virtual unanimidade pela Câmara dos Deputados, tendo tido orientação favorável de todos os partidos”. E destacam: “Dessa forma, uma eventual aprovação de todos os demais projetos de reajuste em trâmite no Congresso Nacional, com escolha para rejeição apenas dos PLs que atingem as magistraturas nacionais, teria como única e efetiva explicação uma retaliação do Governo e das forças políticas à atuação independente e serena de juízes e do Ministério Público no combate à corrupção no Brasil. Não se sustenta qualquer outra justificativa a esta discriminação”.
E mais: “Não há campo, ademais, para soluções excludentes de segmentos da magistratura e do Ministério Público e, nesse sentido, é importante rechaçar informações de que esteja havendo construção de alternativas que contemplem unicamente os ministros do Supremo Tribunal Federal, o que foi pessoal e peremptoriamente desmentido pelo presidente [do STF] Ricardo Lewandowski”.
O pior é que, nesse quesito, o pessoal da toga tem razão. A solução encontrada pelos atuais ocupantes do Palácio do Planalto é estúpida e insustentável, comprovando apenas a fragilidade de um governo sem cérebro. Tivesse autoridade – o que não tem – o governo de Michel Temer, em vez de negar, com oportunismo e desgaste, a simples reposição da inflação nos subsídios de magistrados e membros do MP, concedida de modo transparente, deveria procurar eliminar, por exemplo, dos contracheques dos mesmos beneficiados, aos quais agregaram-se os conselheiros dos Tribunais de Contas, privilégios espúrios como os chamados “auxílios-moradias”, conferidos a quem mora em casa própria, assim como duplos períodos de férias anuais, com adicionais de 50% em cada período (o que equivale a um 14° salário), enquanto o resto da massa trabalhadora (como diziam os falecidos petistas) faz jus apenas a 1/3º de acréscimo e apenas uma vez ao ano.
(*) A magistratura e o Ministério Público do Paraná conseguiram sujar-se um pouco mais, sobretudo perante a imprensa (nacional e até internacional), ao atender à desastrada conclamação da Amapar para processar, nas várias comarcas do Estado, jornalistas da Gazeta do Povo que apenas divulgaram (com base em dados oficiais) o quanto juízes e promotores são capazes de perceber como salário através de manobras (legais?) interna corporis.