Ruy Castro – Folha de São Paulo
Morreu na semana passada, aos 88 anos, Haruo Nakajima, o ator japonês que interpretou o monstro Godzilla em 12 filmes, desde o primeiro, “Godzilla”, de 1954, até “Godzilla contra Megalon”, em 1973. Godzilla, claro, é o lagarto gigante despertado por uma explosão nuclear no Japão. Na prática, era uma roupa de borracha pesando 100 quilos e medindo 2,5 m, do coco à ponta do rabo, que Nakajima, 65 quilos e 1,68 m, usava durante a filmagem.
Sob o calor dos refletores do estúdio, a temperatura dentro da fantasia ia a 50 graus e fazia Nakajima despejar meio balde de suor por dia —tinha de ser reidratado a todo instante, por um canudinho introduzido num buraco da roupa. Só o esforço para rebocar o rabo do monstro era suficiente para deixá-lo moído ao fim de cada take.
Nos filmes, Godzilla pisava e arrasava maquetes de Tóquio, derrubava miniaturas de torres de eletricidade, levando os choques correspondentes, e enfrentava outros monstros do seu calibre, um deles, King Kong. Por causa disso, Nakajima sofreu queimaduras, quebrou costelas e destroncou braços. O que encerrou sua carreira, no entanto, foi a tecnologia. Com os novos recursos eletrônicos, já não era preciso fantasiar ninguém de Godzilla.
Mas Nakajima nunca abandonou o monstro. Levou o resto da vida fantasiado, fazendo aparições especiais em feiras, quermesses e, já que Godzilla não assustava mais ninguém, até em aniversários infantis.
Isto não lhe lembra alguém? Lula. Está em caravana pelo país, arrastando sua fantasia de Godzilla, digo, Lula, por comícios para plateias de militantes profissionais. Joga para a galera, finge soltar fogo e enxofre pelas ventas e cospe marimbondos contra os que o processam. Como Godzilla, julga-se acima da lei. Mas, até para Lula, sua fantasia está cada vez mais difícil de carregar.