Tati Bernardi – Folha de São Paulo
Tenho evitado ir a qualquer evento, almoço ou reunião com mais de dois humanos. Percebi que a cada três pessoas, uma sempre vai falar besteira sobre gravidez. A mais irritante é sobre meu peso ou o tamanho da minha barriga (que os idiotas sempre consideram pequena). “Nossa, tá tudo bem? É que eu engordei 40 quilos e você continua magra… Precisa de ajuda?”. Oi? Seria engraçado não fosse tão invasivo e desrespeitoso: não é mais sobre meu corpo que essas pessoas estão falando, é sobre minha filha. “Ela está no peso ideal”, sou obrigada a responder. Nenhuma dessas pessoas merece atenção, mas já estou protegendo um serzinho que ainda nem nasceu das maledicências dos imbecis.
Fui magrela minha vida inteira e sempre tive que aturar as indagações insuportáveis sobre a minha saúde. Não quero aqui fazer a “minoria sofrida só que não” como aqueles ignorantes que defendem a luta por mais espaço e aceitação para héteros, ricos e brancos. As gordinhas devem aturar uma quantidade muito maior e um teor muito pior de frases escrotas. Mas acreditem em mim: vai ter sempre uma vaca ou um desgraçado esperando chegar uma pessoa magra no recinto pra destilar toda a sua incapacidade em se controlar no pudim. “Nossa, senta aqui, tadinha, tá morrendo!”
Esses dias uma garota que nunca vi na vida colou em mim, no aniversário de uma grande amiga, e começou a narrar quão horrível foi o seu parto. Que ela quase morreu, o filho quase morreu, o médico fez tudo errado, ela está processando o hospital, ela nunca mais quer engravidar na vida, o filho não dorme, não mama, o casamento dela acabou, ela descobriu que a babá a rouba, sua mãe não pode ajudar porque está muito doente e por aí vai.
Eu, que cheguei toda animada na festinha, fui murchando e ficando corcunda, e foram doendo todos os músculos e ossos das minhas costas e quase precisei ser carregada pra casa. Consegui ficar dez minutos na porra da festa por causa desse serzinho de luz que não suportou ver uma grávida felizinha. Ah, detalhe, no dia seguinte ela me achou no Facebook e me mandou a seguinte mensagem: “Desculpa se te enchi com meus problemas, mas é bom pra você saber que não é fácil!”. Esse é o problema dos idiotas. Eles precisam te ajudar, precisam dividir com você essa sabedoria tão divina que diz “a vida não é fácil”. Poxa, idiotas, obrigada! Eu nunca tinha notado! Que presente a sua existência!
Eu já escrevi sobre isso, mas não poderia deixar de citar novamente os idiotas do primeiro trimestre. Eu enjoei demais, tive muito cansaço, estava muito assustada com as mudanças e fiquei bastante deprê. E o que muitas pessoas faziam pra me animar? Me davam bronca! “Mas a gravidez é uma coisa linda, abençoada, é até pecado você estar assim! Você não está feliz?”. Fui parar no psiquiatra, desesperada, chorando 24 horas por dia, repetindo a cada meio segundo a frase “será que não amo o meu bebê e sou uma pessoa horrível e mereço morrer?”. Os idiotas, quando estamos mais sensíveis, têm um poder abissal… E como eles amam isso!
Fiquei algumas semanas um pouco anêmica, o que a obstetra explicou ser muito normal durante a gestação, e me tornei a maluca do limão. Porque o limão “ajuda a absorver o ferro” comecei a espremê-lo até na escova de dente (piada, ok?). Claro que uma idiota de plantão notou minha tática e começou a me contar quão horrível foi o pós-parto da prima dela que ficou anêmica, perdeu muito sangue na cesárea e depois não teve forças pra cuidar do rebento ou até mesmo pra se locomover sem cadeira de rodas. E eu, que só queria comer um franguinho grelhado com limão, tive que ouvir tudo sem avançar na jugular da pessoa. Infelizmente, dá uma preguiça desgraçada bater nos outros quando estamos grávidas, mas me aguardem.