Bernardo Mello Franco – Folha de São Paulo
BRASÍLIA – Líder do centrão na Constituinte, o deputado Roberto Cardoso Alves deixou uma máxima para a história: “É dando que se recebe”. Era uma releitura picareta da oração de São Francisco de Assis. Em vez de pregar a generosidade, o peemedebista defendia as barganhas em troca de votos no Congresso.
Três décadas depois, a frase continua a pautar as relações entre o Planalto e o Legislativo. O velho Robertão está morto, mas o fisiologismo tem um novo porta-voz: é Carlos Marun, recém-promovido a ministro da Secretaria de Governo.
Na semana passada, governadores começaram a acusá-lo de chantagem. Eles dizem que Marun exige votos a favor da reforma da Previdência em troca da liberação de empréstimos da Caixa Econômica Federal.
O primeiro a protestar foi o governador de Sergipe, Jackson Barreto. “Marun me falou que há vários contratos com a Caixa, mas o governo só vai liberar após a votação da reforma. Achei uma coisa fora de propósito”, reclamou, em entrevista ao jornal “O Estado de S. Paulo”.
Em outros tempos, o governo tentaria desmentir a acusação de chantagem explícita. Formado na escola política de Eduardo Cunha, Marun não se preocupa nem com as aparências. Nesta terça-feira, ele confirmou a pressão e defendeu o escambo com verbas da Caixa.
“Financiamentos da Caixa Econômica Federal são ações de governo. Não entendo que seja uma chantagem”, disse o ministro. “O governo espera daqueles governadores que têm recursos a ser liberados […] uma reciprocidade no que tange a questão da Previdência”, acrescentou.
Os bancos públicos podem e devem executar ações de governo, como o financiamento de projetos de infraestrutura e o empréstimo de recursos para Estados e municípios tocarem obras. Condicionar os repasses a votos no Congresso tem outro nome. É o velho “toma lá, dá cá”, que tipos como Robertão e Marun não têm vergonha alguma de defender.