Foi com ele que tudo começou. E poucas figuras animadas, no cinema ou nos quadrinhos, terão tido a fama e a popularidade do camundongo Mickey. Como Mikki Hüri, na Finlândia; Mik-Kü-Ma-U-Su, no Japão; Ratón Mickey, no México; Mickey Maus, na Alemanha; Mickey Lau Shu, na China; ou Topolino, na Itália, hoje como ontem, Mickey Mouse é um ícone conhecido em todo o planeta. Publicado em duas dezenas de idiomas diferentes, em mais de 400 jornais e revistas, com uma tiragem de aproximadamente 1,4 milhões de exemplares por mês, atinge a média anual de 50 milhões de leitores em todo o mundo.
Como a maioria dos personagens de Walt Disney, Mickey também não nasceu nos quadrinhos e sim no cinema, em uma série pioneira de desenhos animados, a primeira animação sonorizada do cinema, Steaboat Willie, com nove minutos de duração, lançado em 18 de novembro de 1928, ou seja, há 90 anos. Aos quadrinhos ele chegou dois anos depois, em 1930.
Seu criador foi um jovem de 27 anos de idade chamado Walter Elias Disney – cujo nome viria a tornar-se sinônimo de fantasia, de fabricante de ilusões, capaz de dar vida a pequenos animais e transformá-los em seres vivos, de carne e ossos, com reações iguais às nossas –, filho de família humilde (o pai era carpinteiro), criado em uma fazenda do Missouri, que nunca terminou o ginásio. Ele era, então, apenas um obscuro desenhista, que fizera de uma velha garagem o seu “estúdio” e tinha dois “sócios”, o também desenhista Ub Iweks e o irmão Roy, e um sonho na cabeça. Mickey foi só parte dele. Ou, melhor, o ponto de partida para a realização desse sonho.
Diz a lenda que, no outono de 1927, Walt Disney voltava para Los Angeles, no compartimento de terceira classe de um trem, depois de haver sido ludibriado em Nova York por um distribuidor mau caráter, que se apossara de uma criação sua (o coelho Oswald), quando viu passar um camundongo. De imediato, surgiu a inspiração.
O acontecimento histórico foi contado por ele próprio:
— Eu estava profundamente triste e decepcionado. Procurava distrair-me, pensar em outras coisas. Foi então que apareceu Mortimer (esse foi o primeiro nome do personagem, mas a esposa de Walt, Lilian Bounds, achou o nome muito “sisudo” e “pomposo”, e sugeriu Mickey, algo como “Miguelzinho”). Atravessando Ohio, vislumbrei um Mortimer ideal: olhos redondos, orelhas achatadas, uma cara humana, as pernas compridas e finas e os braços tão compridos quanto as pernas.
Na verdade, a imagem desse ratinho já acompanhava o jovem Walt há algum tempo. Desde quando, aos 16 anos, ele resolveu deixar a casa dos pais para tentar a sorte por conta própria. Anos mais tarde, confidenciaria à filha, que o biografava:
— Em Kansas City, eu estava tão “quebrado” que passei a morar no próprio estúdio da Laugh-O-Gram, onde trabalhava. E, seguidamente, os camundongos se reuniam em torno de minha cesta de papéis. Um deles até se tornou meu particular amigo…
Há, porém, quem simplesmente se recuse a conferir a Disney a paternidade não apenas de Mickey como de quase toda a rica “fauna disneyana”. Walt seria, quando muito, um inspirador ou supervisor do trabalho. (É certo que ele contava, em sua equipe, com alguns dos mais destacados criadores de cartoons e comics dos EUA, como, por exemplo, Carl Barks, que seria o verdadeiro “pai” do Pato Donald, surgido em 1938, assim como dos três sobrinhos deste; do primo Gastão, de Tio Patinhas, do Prof. Pardal e da Maga Patalogika. Floyd Gottfredson seria o criador de Horácio e Clarabela; e Paul Murry, o idealizador de Pateta e Pluto).
De todo modo, coube a Ub Iwerks, sócio de Walt, dar forma gráfica a Mickey. E quando a primeira aventura (“Mickey na Ilha Misteriosa”) chegou aos jornais, o pequeno herói já galgava os degraus da fama. Daí para o sucesso internacional foi um pulo, enquanto Walt, com muita habilidade e inegável inteligência, transformava o modesto estúdio de fundo de quintal em um império de milhões de dólares. Ele já não era aquele desenhista medíocre, cheio de ideal, mas um poderoso capitão de indústria, plenamente inserido no sistema capitalista americano.
Mickey, por seu turno, também foi mudando de feição e de personalidade com o passar do tempo. Aburguesou-se, claro, e se transformou num mero instrumento do establishment – como registrou o crítico carioca Carlos Alberto Miranda. Não tem mais aquela pureza inicial e, a despeito de usar agora chapéu e gravata, está cada vez mais parecido com um rato.
Depois do falecimento de Disney (em dezembro de 1966), a maioria das histórias de Mickey passou a ser produzida fora dos Estados Unidos, particularmente na Itália e até mesmo no Brasil, nos estúdios da Editora Abril.
No Brasil, Mickey surgiu nas páginas de O Tico-Tico e, em seguida, mudou para o Suplemento Juvenil e O Mirim. Mais tarde, esteve em Seleções Coloridas, primeira publicação da Editora Brasil-América Ltda., a Ebal, de Adolfo Aizen. Em 1950, com a fundação da Editora Abril, que passou a deter, desde então, até meados de 2018, os direitos de publicação de todas as criações dos Estúdios Disney, o camundongo teve as suas aventuras publicadas nas páginas de O Pato Donald, até ganhar revista própria, em 1953.
Happy Birthday, mr. Mouse!