Todos que trabalharam com Fuad Atala ficaram lhe devendo alguma coisa
Em 1961, Jânio Quadros, como se sabe, renunciou à Presidência e deixou o país pendurado na brocha. Na então Guanabara, o governador Carlos Lacerda discordou dos jornais que defendiam a posse do vice João Goulart e mandou a polícia dar-lhes um cala-boca. Mas um deles, oCorreio da Manhã, não se intimidou. Quando os homens de metralhadora invadiram o jornal e apreenderam a edição daquele dia, cinco jornalistas escaparam com pilhas de exemplares, tomaram um carro e foram distribuir de graça o jornal no Largo da Carioca. Foram presos pouco depois, mas o povo ficou sabendo o que Lacerda fizera. Esses jornalistas eram o editor da última página, Carlos Heitor Cony, os repórteres Aziz Ahmed e Álvaro Mendes, o subchefe do Arquivo, Paulo Ramos, e o secretário do jornal, Fuad Atala.
Fuad morreu no dia 24 último, aos 86 anos. Todos que trabalharam com ele ficaram lhe devendo alguma coisa. Cony como cronista, por exemplo, foi ideia dele. Fuad deu-lhe um espaço três vezes por semana no Correio para escrever o que quisesse, e quem acompanhou a carreira de Cony sabe o que ele representou, em 1964, para a democracia no país.
Muitos jornalistas eram obrigados a ter dois empregos e, em 1967, Fuad era também chefe de reportagem da revista Manchete. No auge da guerra árabe-israelense daquele ano, o folclórico proprietário da Manchete, Adolpho Bloch, foi à Redação exigir de seus funcionários fidelidade a Israel. Mas como pode alguém chamado Fuad Atala ser fiel a Israel? Fuad apenas encarou Adolpho e este, dando-se conta, baixou os olhos.
Naquele mesmo 1967, Fuad fez fé num jovem repórter do Correio, quase um “foca”, e o levou para a Manchete. Foi ali que esse garoto começou de fato a se profissionalizar. O garoto era eu.
Pouco antes de ir embora, Fuad concluiu um livro que todos queremos ler: “O Leão Indomado — A História do Correio da Manhã”. E vamos lê-lo.