Olinda, entre outras belezas, tem um museu de esculturas sacras, quase todas de santos conhecidos ou desconhecidos. Todo o espaço de uma das salas é ocupado por homens santos de pedra, salvo por uma vitrine que protege a figura de uma menina adolescente. A menina se destaca do resto justamente por estar cercada de machos beatificados, muitos com quase o dobro do seu tamanho. Outras salas do museu têm um número equilibrado de santos e santas. Algumas das santas são populares, como as Sant’Anas.
A menina não é popular. Não existe, acho eu, outra escultura ou pintura da menina nessa idade, no mundo. Ou será só em Olinda? Depois, a menina entrará em varias histórias. Sua milagrosa história pessoal, a história do Cristo, a história da arte. Por enquanto, ela é apenas uma adolescente a caminho de casa, sem ninguém para avisá-la do que virá. Ou que a História não é para adolescentes.
Um curto texto no chão da redoma nos informa que a menina é Maria, mãe de Jesus. Maria antes de crescer, Maria sem nem imaginar o que a vida lhe prepara, quando crescer. Agora, por que um ateu irremediável como eu está emocionado na frente dessa pequena maria solitária, a caminhos de ser a Maria mãe e santa? A menina que me olha através do vidro da vitrine não sabe, mas ela já é a Maria que Michelangelo esculpirá na sua Pietà, um filho morto no colo da mãe, toda a dor do mundo tirada de um bloco de mármore, e não há nada que eu possa fazer, minha filha.
O Fernando Sabino contava que um amigo seu dizia:
– Eu não acredito em Deus, mas tenho uma certa queda pela Virgem Maria…
Eu também. Maria é devidamente cultuada por cristãos. Existe mesmo uma forte corrente marista na Igreja. Mas é inescapável a sensação de que ela não recebe toda a devoção que merece. A Bíblia, por exemplo, descreve toda ascendência, através de gerações, não da Maria – mas do José! Que, como se sabe, não teve nenhum papel na concepção ou no destino de Jesus. Protesto.