Cinemateca no limbo

Urge solucionar impasse jurídico que ameaça um acervo valioso

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O imbróglio que envolveu a saída da atriz Regina Duarte da Secretaria Especial da Cultura e culminou com sua designação para a Cinemateca Brasileira, afinal não concretizada, serviu ao menos para jogar luz sobre a situação de penúria em que se encontra a instituição.

Criada em 1956 pelo crítico Paulo Emílio Sales Gomes e dona de um respeitável acervo de cerca de 250 mil rolos de filmes, além de mais de 1 milhão de documentos, a Cinemateca é hoje a principal guardiã da memória do cinema brasileiro.

Tal papel não foi suficiente, entretanto, para evitar que a instituição fosse deixada, desde o início do ano, numa espécie de limbo jurídico-institucional, que atravanca o repasse de recursos e ameaça a integridade de seu patrimônio.

O problema remonta a 2018, no governo Michel Temer (MDB), quando o Ministério da Cultura transferiu a administração da Cinemateca para uma organização social, a Associação Comunicativa Roquette Pinto (Acerp), que à época geria a TV Escola, ligada ao MEC.

Ocorre que o novo convênio, em razão de uma parceria entre as duas pastas, acabou sendo formalizado como um adendo ao já existente. Assim, em dezembro de 2019, quando o ex-ministro da Educação Abraham Weintraub suspendeu o contrato da pasta com a Acerp, a Cinemateca também foi atingida.

O ato do MEC anulou a gambiarra jurídica, a princípio vigente até 2021, acarretando o colapso financeiro da instituição cinematográfica. O governo Bolsonaro ainda não depositou nenhuma parcela do repasse previsto de R$ 12 milhões à organização social neste ano.

Funcionários já não recebem seus salários desde abril, e contratos com terceirizados estão prestes a acabar ou foram interrompidos. A situação levou o Ministério Público Federal a solicitar da Secretaria da Cultura esclarecimentos sobre a falta de pagamentos, ato que pode resultar numa ação civil pública contra o órgão.

Diante da demora da administração federal em apresentar uma solução para a mixórdia, o prefeito de São Paulo, Bruno Covas (PSDB), encetou conversas com a Secretaria de Governo, a fim de transferir a gestão da instituição para o município, sede da Cinemateca.

Qualquer que seja o desfecho, cumpre que o impasse seja resolvido o quanto antes, e seja normalizada a situação orçamentária. O abandono põe sob ameaça crescente um acervo inestimável —e repleto de materiais inflamáveis.

Sobre Solda

Luiz Antonio Solda, Itararé (SP), 1952. Cartunista, poeta, publicitário reformado, fundador da Academia Paranaense de Letraset, nefelibata, taquifágico, soníloquo e taxidermista nas horas de folga. Há mais de 50 anos tenta viver em Curitiba. É autor do pleonasmo "Se não for divertido não tem graça". Contato: luizsolda@uol.com.br
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